Carlos Moreira, “o poeta do Nada” – Por Professor Nazareno*

Carlos Moreira, “o poeta do Nada” – Por José Nazareno*

Carlos Moreira, “o poeta do Nada” – Por Professor Nazareno*

Foto: Divulgação

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Em momento algum pensei em substituir a contração do título (de + o) por uma preposição (de). Você me conhece, amigo: com o meu olhar “doente e torto” e diante do seu excelente trabalho quase que isto acontecia: Evangelho Segundo Ninguém, Trilogia do Vazio, Não e Nada são obras que remetem aos incautos e desavisados a idéia de que você ainda não escreveu. Talvez por isso, a sua poesia “sempre dialogou com o silêncio: se as palavras servem para esconder, o essencial está no não-dito, no interdito: poesia enquanto síntese, linguagem carregada de sentido em seu quase-nada: aquilo que se pensa não é aquilo que se escreve que não é aquilo que o leitor-autor entende: comunicação enquanto re-in-versão, invenção”.

 

Além do mais, você poetizou “a Pérola das Pérolas”, a “Veneza de Rondônia”, a Calama velha de guerra: lobos e urubus/ caminham entre crianças/ o dia é claro/ estou à beira do abismo/ e observo silenciosamente/ e sinto em cada hora o mesmo grão/ meu coração está em toda parte/ por todo lado meu olhar passeia/ e se transforma no espelho circular/ desenhado sobre o lago/ eu nada peço: nada/ me oferecem/ a tarde escorre /e o universo dorme/ devagar. Não só a poetizou quando lá esteve, como também, viu, sentiu, dormiu, comeu, bebeu, pensou e refletiu. Coisas de poeta mesmo. Por isso o barranco devia te agradecer envaidecido. Não seria o momento de pensar em  lançar futuramente um tal de “Os Evangelhos das Escrituras Beiradeiras?”.

 

Obrigado, grande amigo, pois me identifico com muito do que vi nas obras: “desculpe farpas e espinhos/ é que nasci sem pele/ e vou me cobrindo com o que encontro/ pelo caminho”. Ah! Se tivesse a sua verve! Maldizia Porto Velho, maldizia Rondônia, maldizia o Nordeste, maldizia o Brasil, maldizia a cultura ocidental, maldizia o mundo habitado por humanos (?) e hipócritas. E sem ameaças, continuava a escrever contra tudo e todos e ainda coçava a barriga cheia de cerveja vendo, sem culpa alguma, “a fumaça dos crematórios subir aos ares” enquanto, num bar, vibrava com os gols do meu Flamengo, tecia loas aos governantes patifes, transformava o telurismo em religião, mandava os tristes viverem felizes e por tudo isso ainda recebia efusivos aplausos.

 

E para quem não acreditar que ainda esteja vivo, diga-lhes que no além é tudo como aqui. Digo isto porque “já morri várias vezes” e sem cansar de tanto morrer, ainda semeio palavras que procuram a morte. Gostaria, assim como você o faz, de dialogar com o silêncio, de ser sutil e educado, mas só vejo sentido nas palavras quando elas atiçam o “contrapelo”, irritam, enfurecem, provocam reações. A sua obra vai certamente deixá-lo bem vivo por muito tempo. Só não o invejo porque já disse que trocaria a oportunidade de lançar um livro pela possibilidade de montar um cabaré e vender  cachaça para as putas, pois neste “brasil” seria uma profissão com possibilidades de ficar rico. Ter um filho, plantar uma árvore e montar um cabaré. Para quê querer mais?

 

*Professor Nazareno leciona em Porto Velho.

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