Política em Três Tempos
1 – PMDB EM TRANSE
A se levar a sério a entrevista do senador Jarbas Vasconcelos (PMDB-PE), dada à revista “Veja, é mais do que desolador o cenário da política brasileira. Na verdade, o quadro é para lá de trágico, ou seja, simplesmente não tem saída, como adiante se verá. Sobrou, claro, para o PMDB, porquanto este é o partido do parlamentar e nada repercute mais do que um ente da família descer o sarrafo na própria casa. É disso que o povo gosta –
da volta do cipó de aroeira no lombo de quem mandou dar (ouça música) – e as mídias não se fazem de rogadas. Para se ter uma idéia, é só lembrar do estrago que o finado Pedro Collor de Mello provocou nos costados do irmão Fernando ao abrir a caixa de Pandora governo collorido numa entrevista para a mesma publicação.
Conquanto toda a repercussão esteja concentrada em cima das mazelas que assolam o seu partido, o fato é que o peemedebista soltou os cachorros também para cima do presidente Lula da Silva (PT) e seu governo, não bastasse ter falado ainda cobras e lagartos de todos os partidos e das oposições em geral. Embora se dizendo decidido a permanecer na agremiação – “É melhor ficar como dissidente, lutando por uma reforma política para fazer um partido novo” -, disse e repetiu que o seu partido gosta é da corrupção. Assim, como na maior parte do tempo aparentou cortar na carne, o PMDB é que terminou ficando mesmo no prejuízo.
Pior. Numa situação de quem não sabe o que fazer com uma batata quente atirada em sua direção. Deixa-la cair, ou seja, fazer de conta que não é consigo, soaria como um cinismo atroz, capaz de destroçar de vez todos os fiapos de confiança que ainda restam no partido. Atira-la de volta, quer dizer, rebater o senador adornando-o com umas vilezas introduz a probabilidade de realçar ainda mais a sua atual visibilidade. Manda-lo plantar a dita cuja, ou seja, expulsá-lo incontinente, além de representar o risco de transformá-lo num mártir, pode acabar como recompensa, porquanto poder ser que o que Jarbas Vasconcelos esteja querendo seja isso mesmo – cair fora e trocar de partido.
Afinal, há mais do que rumores indicando que um dos mais cacifados candidatos a candidato à Presidência, o governador José Serra (PSDB-SP), o quer como vice em sua eventual chapa. O que, como hipótese, se evidencia uma grande jogada, porquanto racha o PMDB, contempla o eleitor nordestino e adensa o palanque tucano com um nome da envergadura de um Jarbas Vasconcelos – peemedebista histórico, duas vezes prefeito de Recife, duas vezes governador de Pernambuco e senador de reputação irretocável.
2 – SARNEY & LULA
Mas, enfim, qual o contexto político do país segundo Jarbas Vasconcelos? Começa pelo novo presidente da Casa em que o pernambucano tem assento: “É um completo retrocesso. A eleição de Sarney foi um processo tortuoso e constrangedor. Havia um candidato, Tião Viana, que, embora petista, estava comprometido em recuperar a imagem do Senado. De repente, Sarney apareceu como candidato, sem nenhum compromisso ético, sem nenhuma preocupação com o Senado, e se elegeu. A moralização e a renovação são incompatíveis com a figura do senador. Sarney vai transformar o Senado em um grande Maranhão.”
Segue pelo novo líder do seu partido Senado, Renan Calheiros: “Ele não tem nenhuma condição moral ou política para ser senador, quanto mais para liderar qualquer partido. Renan é o maior beneficiário desse quadro político de mediocridade em que os escândalos não incomodam mais e acabam se incorporando à paisagem.” Vai adiante falando sobre seu partido: “Hoje, o PMDB é um partido sem bandeiras, sem propostas, sem um norte. É uma confederação de líderes regionais, cada um com seu interesse, sendo que mais de 90% deles praticam o clientelismo, de olho principalmente nos cargos. Boa parte do PMDB quer mesmo é corrupção.” Sobre as demais legendas: “A corrupção está impregnada em todos os partidos.”
Sobre ter apoiado Lula, de quem quase chegou a ser vice: “Quando Lula foi eleito em 2002, eu vim a Brasília para defender que o PMDB apoiasse o governo, mas sem cargos nem benesses. Era essencial o apoio a Lula, pois ele havia se comprometido com a sociedade a promover reformas e governar com ética. Com o desenrolar do primeiro mandato, diante dos sucessivos escândalos, percebi que Lula não tinha nenhum compromisso com reformas ou com ética. Também não fez reforma tributária, não completou a reforma da Previdência nem a reforma trabalhista. Então eu acho que já foram seis anos perdidos. O mundo passou por uma fase áurea, de bonança, de desenvolvimento, e Lula não conseguiu tirar proveito disso.”
3 – ÚLTIMO A SAIR
Mais sobre o governo petista: “O grande mérito de Lula foi não ter mexido na economia. Mas foi só. O país não tem infra-estrutura, as estradas são ruins, os aeroportos acanhados, os portos estão estrangulados, o setor elétrico vem se arrastando. A política externa do governo é outra piada de mau gosto. Um governo que deixou a ética de lado, que não fez as reformas nem fez nada pela infra-estrutura agora tem como bandeira o PAC, que é um amontoado de projetos velhos reunidos em um pacote eleitoreiro. É um governo medíocre. E o mais grave é que essa mediocridade contamina vários setores do país. Não é à toa que o Senado e a Câmara estão piores. Lula não é o único responsável, mas é óbvio que a mediocridade do governo dele leva a isso.”
Sobre a popularidade do presidente: “O marketing e o assistencialismo de Lula conseguem mexer com o país inteiro. Imagine isso no Nordeste, que é a região mais pobre. O Bolsa Família é o maior programa oficial de compra de votos do mundo.” Sobre as oposições: “Temos aqui trinta senadores contrários ao governo. Sempre defendi que cada um de nós fiscalizasse um setor importante do governo. Olhasse com lupa o Banco do Brasil, o PAC, a Petrobras, as licitações, o Bolsa Família, as pajelanças e bondades do governo. Mas ninguém faz nada.”
E sobre os políticos em geral: “A classe política hoje é totalmente medíocre. E não é só em Brasília. Prefeitos, vereadores, deputados estaduais também fazem o mais fácil, apelam para o clientelismo. Na política brasileira de hoje, em vez de se construir uma estrada, apela-se para o atalho.”
Como se vê, sobrou apenas o próprio Jarbas Vasconcelos. Menos mal, que sobrou pelo menos um. Sobrou? Qual o quê! Quando se quer saber qual a saída, eis o que o pernambucano, reforçando as suspeitas de que seu ataque seja cálculo, responde: “Acredito muito em Serra e me empenharei em sua candidatura à Presidência.” Muito conveniente. Mas muito conveniente, mesmo. Que desperdício! Enfim, na hipótese de que as coisas estejam como diz o senador, resta apelar para aquela frase que se dizia no tempo em que a ditadura oferecia como alternativa “Brasil, ame-o ou deixe-o”: o último a sair apague a luz do aeroporto.