O crime foi praticado, na época, pelo menor Thales M. E. F, na época com 10 anos contra Marcos Rangel Chaves Santana, de 15. Thales era filho do dono do sítio, e a vítima, filho dos caseiros da propriedade.
Foto: Divulgação
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Os desembargadores da 2ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Rondônia reconheceu a responsabilidade civil de um pai de família de Ji-Paraná pelo assassinato praticado pelo filho menor contra outro menor na zona rural da cidade. O crime aconteceu no mês de julho de 2008 e foi julgado pelo 2011 pelo Juízo da 4ª Vara Cível de Ji-Paraná.
O crime foi praticado, na época, pelo menor Thales M. E. F, na época com 10 anos contra Marcos Rangel Chaves Santana, de 15. Thales era filho do dono do sítio, e a vítima, filho dos caseiros da propriedade. Os menores eram amigos e, no dia do crime, o pai do autor do crime, Homero Franco, havia deixado o filho sob a guarda dos pais da vítima.
Thales e Rangel saíram para caçar e, em dado momento, a rotina do sítio foi quebrada por um barulho de tiro vindo do curral. Marcos Rangel foi mortalmente ferido por um tiro acidental, vindo a morrer em seguida no momento em que era socorrido. Desde essa época, a família da vítima vem tentando na Justiça reparar a morte do filho.
Os desembargadores da 2ª Câmara Cível mudaram o veredito de primeira instância porque entenderam que a responsabilidade objetiva era do pai do menor Thales. Isso porque Thales, segundo o Ministério Público, era acostumado a manusear armas e andava livremente com a arma do crime (um rifle) pela propriedade, sem qualquer tipo de controle.
Thales, segundo testemunhas, ouvidas na delegacia tinha sido alertado várias vezes por outros trabalhadores do sítio para que não andasse armado, mas ele sempre rechaçava a ideia. Apurou-se ainda que ele já manuseava arma praticando tiro ao alvo desde os oito anos de idade. A arma, no entanto, ficava guardada na dispensa dos pais da vítima.
Seguindo o voto do relator, os desembargadores decidiram que o pai de Thales, deve responder objetivamente pelo assassinato porque “falha no dever de cuidado
do filho menor”. Segundo eles, Homero Franco “permitiu o e seu acesso à arma de fogo municiada e ao alcance, “devendo responder pelo ato e consequente dano praticado consistente em morte, ainda que acidentalmente”.
Na nova sentença, ficou arbitrado o pagamento de indenização por dano moral de R$ 100 mil aos pais da vítima, corrigidos, além do pagamento de pensão mensal no valor de 2/3 do salário mínimo a ser pago desde a data do evento até a
data em que a vítima completaria 25 (vinte e cinco) anos de idade e, a partir daí,
reduzido para 1/3 do salário até o óbito dos beneficiários da pensão ou da data em
que a vítima completaria 70 (setenta) anos de idade.
CONFIRA A SENTENÇA;
Poder Judiciário do Estado de Rondônia
2ª Câmara Cível
Data de distribuição : 16/07/2014
Data do julgamento : 07/06/2017
0002212-07.2011.8.22.0006 - Apelação
Origem : 0002212-07.2011.8.22.0006 Ji-Paraná/RO (4ª Vara Cível)
Apelantes : José Marcos Santos Santana e outra
Advogada : Elisângela de Oliveira Teixeira (OAB/RO 1043)
Advogado : Luiz Carlos Barbosa Miranda (OAB/RO 2435)
Apelado : Homero Franco
Advogada : Elaine Cristina Barbosa dos Santos Franco (OAB/RO 1627)
Advogada : Maria Eunice de Oliveira (OAB/RO 2956)
Relator : Desembargador Marcos Alaor Diniz Grangeia
EMENTA
Apelação cível. Responsabilidade civil exclusiva e objetiva.
Arma de fogo. Acesso. Acidente. Menor que atira em outro menor.
Morte. Indenização. Deveres. Cuidado e vigilância. Negligência.
Pensão alimentícia. Constituição de capital. Verbas de sucumbência.
É objetiva a responsabilidade do pai que falha no dever de cuidado
do filho menor e permite seu acesso à arma de fogo municiada e ao alcance,
devendo responder pelo ato e consequente dano praticado consistente em morte,
ainda que acidentalmente.
O arbitramento das indenizações decorrentes de dano moral deve ser
feita caso a caso, com bom senso, moderação e razoabilidade, atentando-se à
proporcionalidade com relação ao grau de culpa, extensão e repercussão dos danos,
à capacidade econômica, características individuais e ao conceito social das partes.
É cabível a fixação de pensão mensal em decorrência do falecimento
de filho, nos termos da legislação civil, bem como a determinação de constituição de
capital a fim de assegurar o recebimento da referida pensão.
Reconhecida a procedência do pedido inicial o ônus da sucumbência
deve ser invertido e, no caso, aplicada a norma vigente ao tempo da prolação da
sentença.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os
desembargadores da 2ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado de Rondônia,
na conformidade da ata de julgamentos e das notas taquigráficas, em:
POR UNANIMIDADE, DAR PROVIMENTO AO RECURSO NOS
TERMOS DO VOTO DO RELATOR.
O desembargador Isaias Fonseca Moraes e o juiz Carlos Augusto
Teles de Negreiros acompanharam o voto do relator.
Porto Velho, 07 de junho de 2017.
DESEMBARGADOR MARCOS ALAOR DINIZ GRANGEIA
RELATOR
Poder Judiciário do Estado de Rondônia
2ª Câmara Cível
Data de distribuição : 16/07/2014
Data do julgamento : 07/06/2017
0002212-07.2011.8.22.0006 - Apelação
Origem : 0002212-07.2011.8.22.0006 Ji-Paraná/RO (4ª Vara Cível)
Apelantes : José Marcos Santos Santana e outra
Advogada : Elisângela de Oliveira Teixeira (OAB/RO 1043)
Advogado : Luiz Carlos Barbosa Miranda (OAB/RO 2435)
Apelado : Homero Franco
Advogada : Elaine Cristina Barbosa dos Santos Franco (OAB/RO 1627)
Advogada : Maria Eunice de Oliveira (OAB/RO 2956)
Relator : Desembargador Marcos Alaor Diniz Grangeia
RELATÓRIO
Trata-se de apelação cível interposta por José Marcos Santos
Santana e Vilma Chaves Santos nos autos da ação de responsabilidade civil
interposta contra Homero Franco, cuja sentença traz a seguinte narrativa das
alegações das partes:
[…] José Marcos dos Santos Santana e Vilma Chaves Santos,
propõe ação ordinária em face de Homero Franco, objetivando a
condenação do mesmo ao pagamento de indenização por danos materiais
e morais, ao fundamento de que são genitores de Marcos Rangel Chaves
Santana, falecido em 04/07/2.008, vítima de disparo de arma de fogo, o
qual resultou sua morte.
Alega que o disparo foi efetuado pelo menor Thales Medeiros
Excel Franco, filho do requerido, que a época dos fatos contava com 11
(onze) anos de idade.
Afirma que era corriqueiro que o menor Thales estivesse de posse
de arma de fogo, tendo em vista que o requerido ensinava-lhe a praticar tiro
ao alvo.
Alega que a conduta negligente do requerido, fez com que o os
requerentes perdessem seu filho de forma cruel, que a época dos fatos ia
completar 15 (quinze) anos de idade.
Assim, pleiteiam a condenação do requerido ao pagamento de
danos morais no valor equivalente a 300 (trezentos) salários mínimos,
assim como requerem a condenação do mesmo ao pagamento de 2/3 do
salário mínimo a cada um dos requerentes, até que vítima completasse 25
(vinte e cinco) anos de idade e que após essa data seja reduzido para 1/3
para cada um dos requerentes, ate quando os requerentes completarem 70
(setenta) anos de idade.
Juntaram procuração e documentos (fls. 16/116).
Devidamente citado o requerido apresentou contestação (fls.
125/146), arguindo a preliminar de prescrição, ao fundamento de que o
evento ocorreu em 04 de julho de 2.008 e a ação somente foi proposta em
06 de dezembro de 2.011.
Alega que não há como prosperar as alegações dos requerentes,
porquanto o filho do requerido não assassinou o menor Marcos Rangel, vez
que se trata o caso de um acidente terrível para ambas as partes, sendo
que a arma municiada estava na casa dos autores e estes permitiram que o
filho do requerido, Thales, pegasse referida arma.
Aduz que os requerentes deveriam ter impedido que o filho do
requerido pegasse a arma de fogo, tendo em vista que o mesmo estava sob
a responsabilidade dos mesmos, razão pela qual assumiram o risco, vez
que na ocasião dos fatos o requerido não estava no local.
Afirma que os requerentes agiram com negligência, eis que
deixaram de adotar as cautelas e providências necessárias que teria
evitado o resultado fatal.
A responsabilidade dos requerentes é concorrente, porquanto o
menor Thales, filho do requerido, estava sob a responsabilidade dos
mesmos, sendo que este permitiram que a criança ficasse de posse da
arma de fogo.
Ressalta que não há que se falar em indenização por danos
morais, haja vista que o requerido não praticou nenhum ato ilícito para
ensejar a reparação por danos morais.
Não procede o pedido de pensão mensal, vez que o requerido não
pode ser responsabilizado pela morte do filho dos requerentes, pois não
agiu com negligência.
Os requerentes impugnaram a contestação (fls. 165/167).
Este Juízo rejeitou a preliminar de prescrição suscitada pelo
requerido, designou audiência de instrução e julgamento a fim de dirimir a
controvérsia existente nos autos, vez que os requerentes alegam a
negligência do requerido em permitir que seu filho manuseasse arma de
fogo, o qual resultou a morte do filho dos mesmos.
Por outro lado, o requerido alega que a negligência em permitir que
seu filho portasse arma de fogo foi dos requerentes, vez que o menor
estava sob a guarda dos mesmos, de modo que eles tinham o dever de
cuidado (fls. 169/170).
Na audiência de instrução, foi proposta a conciliação entre as
partes a qual restou infrutífera, ocasião em que este Juízo determinou a
expedição de carta precatória, para oitiva da testemunha arrolada pelos
requerentes. Posteriormente, este Juízo tomou depoimento pessoal dos
requerentes e da testemunha por estes arroladas, bem como do requerido e
da testemunha por ele arrolada (fls.185/186).
As partes apresentaram memoriais (fls. 205/212 e 213/222)
Na sentença (fls. 249/252), o pedido inicial foi julgado sob os
seguintes fundamentos:
[…] Desse modo, tenho que os requerentes deram causa ao
evento danoso, já que detinham o dever de cuidado do menor, inexistindo
responsabilidade do requerido, haja vista que no momento do infortúnio
este não estava presente no local, justamente porque entre as partes havia
uma relação de confiança.
Com relação à arma de fogo que estava na casa do requerido, o
simples fato deste possuí-la, por si só, não implica em negligência do
requerido, mormente pelo fato de que é costumeiro que pessoas que
residem em área rural possuam este tipo de arma.
Por outro lado, a alegação dos requerentes de que era corriqueiro
que o menor Thales estivesse de posse de arma de fogo, tendo em vista
que o requerido lhe ensinava a praticar tiro ao alvo, não foi comprovada nos
autos, haja vista que as testemunhas arroladas por ambas as partes
afirmaram desconhecer tal fato (fls. 187/186 e 202).
Portanto, tendo sido comprovado a culpa dos requerentes para a
ocorrência do infortúnio, que resultou na morte do filho dos mesmos, os
pedidos formulados devem ser rejeitados.
Decisão
Diante do exposto, julgo improcedentes os pedidos formulados
pelos requerentes.
Sem custas e honorários, tendo em vista que os requerentes são
beneficiários da justiça gratuita. [...]
Recorrem os autores (fls. 255/276) para arguir que as provas
constantes nos autos não foram valoradas corretamente e é do apelado a
responsabilidade pela morte do filho dos apelantes por culpa in vigilando e in
omittendo, quando deixou de observar as cautelas necessárias para impedir que seu
filho com 10 anos, na data do fato, usasse arma de fogo.
Traz julgados de outros tribunais pátrios que entende pertinentes e
pede o provimento do recurso para que seja reformada a sentença a fim de
reconhecer a responsabilidade civil de Homero Franco e, consequentemente,
condená-lo ao pagamento de indenização por dano moral no valor de 300 vezes o
valor do salário mínimo, pensão alimentícia no valor de 2/3 do salário mínimo,
determinar a constituição de capital para garantir o pagamento da pensão, nos
termos do art. 475-Q do CPC/73, além de condená-lo ao pagamento das custas
processuais e honorários de advogados.
Contrarrazões do apelado (fls. 279/289) pelo não provimento do
recurso e condenação dos autores e advogada em litigância de má-fé.
É o relatório.
VOTO
DESEMBARGADOR MARCOS ALAOR DINIZ GRANGEIA
O recurso foi interposto sob a égide do CPC/73, portanto, sua análise
se pautará pela disciplina existente à época, a cujos princípios e disposições
normativas estavam as partes subordinadas quando da prolação da sentença.
De plano, insta afastar o pedido de litigância de má-fé deduzido nas
contrarrazões da apelação, visto que não ficou configurada nenhuma das hipóteses
aludidas no art. 17 do CPC/73, senão o uso dos argumentos e vernáculo julgados
necessários pela parte apelante que se mostram consentâneos com a atenção que o
caso requer.
Passo à análise da matéria devolvida a julgamento.
I – Da responsabilidade
José Marcos Santos Santana e Vilma Chaves Santos pretendem ver
declarada a responsabilidade civil por danos moral e material (pensão) de Homero
Franco, em razão da morte de seu filho Marcos Rangel Chaves Santana, decorrente
do acidente com arma de fogo disparada pelo filho do apelado, Thales Medeiros Exel
Franco.
O acidente ocorreu no dia 04/07/2008 na propriedade rural em que os
apelantes trabalhavam como funcionários do apelado e, à época, o filho dos
apelantes tinha 14 anos e 10 meses de idade e o filho do apelado, 10 anos de idade.
Não há negativa dos fatos, mas divergência quanto à
responsabilidade pelo dano causado.
Em primeiro grau foi reconhecida a responsabilidade dos autores, pai
e mãe da vítima em razão de estarem, no momento do ocorrido, exercendo o dever
de cuidado do menor que disparou a arma.
Não obstante os fundamentos constantes na sentença, os
acontecimentos induzem a uma conclusão diversa.
Para melhor análise dos autos, parto da premissa prevista no Código
Civil no sentido de que se presume a responsabilidade de quem exerce o poder
familiar.
É responsável civilmente quem deu causa ao prejuízo e, por
consequência, será obrigado a reparar o dano.
Corolário a essa premissa, por previsão legal constante no art. 932,
inciso I, do Código Civil são responsáveis objetivamente os pais, pelos filhos menores
que estiverem sob sua autoridade ou em sua companhia.
Sobre o assunto, em Jornada de Direito Civil do Conselho da Justiça
Federal foram aprovados dois enunciados, cujos textos finais destacam:
Enunciado 450:
Considerando que a responsabilidade dos pais pelos atos danosos
praticados pelos filhos menores é objetiva, e não por culpa presumida,
ambos os genitores, no exercício do poder familiar, são, em regra,
solidariamente responsáveis por tais atos, ainda que estejam separados,
ressalvado o direito de regresso em caso de culpa exclusiva de um dos
genitores.
Enunciado 451:
A responsabilidade civil por ato de terceiro funda-se na
responsabilidade objetiva ou independente de culpa, estando superado o
modelo de culpa presumida.
O Superior Tribunal de Justiça, em recente julgado (REsp
n.1.436.401-MG), ao analisar o artigo citado, firmou o seguinte entendimento:
DIREITO CIVIL. RESPONSABILIDADE CIVIL POR FATO DE
OUTREM - PAIS PELOS ATOS PRATICADOS PELOS FILHOS MENORES.
ATO ILÍCITO COMETIDO POR MENOR. RESPONSABILIDADE CIVIL
MITIGADA E SUBSIDIÁRIA DO INCAPAZ PELOS SEUS ATOS (CC, ART.
928). LITISCONSÓRCIO NECESSÁRIO. INOCORRÊNCIA.
1. A responsabilidade civil do incapaz pela reparação dos danos é
subsidiária e mitigada (CC, art. 928).
2. É subsidiária porque apenas ocorrerá quando os seus genitores
não tiverem meios para ressarcir a vítima; é condicional e mitigada porque
não poderá ultrapassar o limite humanitário do patrimônio mínimo do infante
(CC, art. 928, par. único e En. 39/CJF); e deve ser equitativa, tendo em
vista que a indenização deverá ser equânime, sem a privação do mínimo
necessário para a sobrevivência digna do incapaz (CC, art. 928, par. único
e En. 449/CJF).
3. Não há litisconsórcio passivo necessário, pois não há obrigação
- nem legal, nem por força da relação jurídica (unitária) - da vítima lesada
em litigar contra o responsável e o incapaz. É possível, no entanto, que o
autor, por sua opção e liberalidade, tendo em conta que os direitos ou
obrigações derivem do mesmo fundamento de fato ou de direito (CPC,73,
art. 46, II) intente ação contra ambos - pai e filho -, formando-se um
litisconsórcio facultativo e simples.
4. O art. 932, I do CC ao se referir a autoridade e companhia
dos pais em relação aos filhos, quis explicitar o poder familiar (a
autoridade parental não se esgota na guarda), compreendendo um
plexo de deveres como, proteção, cuidado, educação, informação,
afeto, dentre outros, independentemente da vigilância investigativa e
diária, sendo irrelevante a proximidade física no momento em que os
menores venham a causar danos.
5. Recurso especial não provido. (REsp 1436401/MG, rel. min. Luis
Felipe Salomão, Quarta Turma, julgado em 02/02/2017, DJe 16/03/2017 –
grifo nosso).
No teor do voto, o ministro-relator explica:
[…] deve-se ter em mente que, com o advento da
responsabilização objetiva, tornou-se indiferente eventual arguição de
ausência de omissão com relação ao dever de guarda, inclusive porque,
como dito, o viés atual é o de garantir ressarcimento à vítima.
Na verdade, ao se referir a autoridade e companhia, quis a norma,
a meu juízo, explicitar o poder familiar, até porque a autoridade parental não
se esgota na guarda, além de que o poder familiar compreende um plexo
de deveres como, proteção, cuidado, educação, informação, afeto, dentre
outros, independentemente da vigilância investigativa e diária.
Notadamente com relação à expressão legal "em sua companhia",
como se vê, a norma não foi muito precisa.
Por óbvio que "não se trata de proximidade física no momento do
dano. Mesmo que o menor, em viagem, cause danos a terceiros, tais danos
estão sob o amparo do dispositivo em questão. Seria absurdamente
contrário à teleologia da norma responsabilizar apenas os pais pelos danos
que os filhos causem 'ao lado' deles. Não é essa, decerto, a interpretação
possível do dispositivo em questão. Cabe aos pais contribuir para a
formação dos hábitos e comportamentos dos filhos, e isso se reflete, de
modo sensível, quando os menores estão fora do lar, e não se encontram
sob a proteção direta deles, e nem haja fiscalização familiar. É irrelevante,
portanto, para a incidência da norma, a proximidade física dos pais, no
momento em que os menores causam danos" (FARIAS, Cristiano. Novo
tratado de responsabilidade civil. São Paulo: Atlas, 2015, p. 604) –
destaquei.
No voto, é citada, ainda, doutrina especializada sobre o assunto:
[…] A doutrina especializada destaca, ainda, quanto aos sobreditos
requisitos:
Requisitos para a responsabilidade dos pais são que o menor
esteja sob sua autoridade e em sua companhia. O Código anterior utilizava
no lugar de autoridade o termo poder, o que levava a crer que o detentor do
pátrio poder respondia sempre pelos atos do menor (Aguiar Dias, Da
responsabilidade , vol. II, p. 112). Ainda que o poder dos pais sobre o filho
fosse, no caso concreto, inefetivo, não havendo razão jurídica para afastar
o pátrio poder, os pais eram tidos como responsáveis (Caio Mário da Silva
Pereira, Responsabilidade Civil, p. 91). O CC, ao empregar a expressão
sob sua autoridade, parece ter procurado preservar a abrangência da
responsabilidade, atingindo também os pais que, embora não
detentores da guarda, têm os filhos sob sua autoridade parental. Como
no CC1916, fala-se em companhia, mas o termo deve ser entendido
mais no sentido de influência sobre a criança do que de uma vigilância
concreta e um contato físico permanente com o menor. De qualquer
forma, e coerente com a finalidade legislativa que é a proteção integral
da vítima, caberá aos pais a prova de uma razão jurídica justificadora
de por que não tinham os filhos menores sob sua companhia, para
eximir-se da responsabilidade. (TEPEDINO, Ob.cit., p.832)
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Folha n.: 9
Essa espécie de responsabilidade, como se vê, tem por
fundamento o exercício do poder familiar, que impõe aos pais
obrigações várias, entre as quais a de assistência material e moral
(alimentos, educação, instrução) e de vigilância, sendo esta nada mais
que um comportamento da obra educativa.[…]
Se os pais têm agora responsabilidade objetiva em relação aos
filhos menores, que motivos podem invocar para exonerar-se dessa
responsabilidade? Isso só pode ocorrer se e quando os pais perderem,
jurídica e justificadamente, o poder de direção sobre o filho menor,
cabendo-lhe o ônus dessa prova. (Carlos Alberto Menezes Direito e
Sergio Cavalieri Filho, in Comentários ao Novo Código Civil, Sálvio de
Figueiredo Teixeira (coord.), v. XIII, Rio de Janeiro, Forense, 2004, p. 203-
204).
Quanto ao significado do vocábulo companhia, cabe breve
esclarecimento. O legislador não pretendeu atribuir responsabilidade
aos pais, pelos atos dos filhos menores, apenas quando estiverem sob
vigilância imediata e residindo no mesmo local. É muito comum o fato
de os pais permanecerem em determinado endereço enquanto a prole
destaca-se para outras cidades, fixando novo domicílio, com o fito de
completar seus estudos. Mesmo que isso aconteça, a aplicabilidade do
mandamento legal em nada será abalada, eis que a palavra companhia
tem relação direta com o exercício da autoridade paterna e materna, de
maneira que compreende todas as situações em que vigora o pátrio
poder e os filhos estão efetivamente a ele submetidos, embora
distanciados fisicamente. (MATIELLO, Fabrício Zamprogna, Código civil
comentado, São Paulo: LTr, p. 583). - destaques originais.
Em comentário ao mesmo artigo 932 do Código Civil, Nelson e Rosa
Nery indicam que, na espécie, delineia-se uma presunção de culpa cuja fonte é
justamente o poder familiar. E seguem os autores:
[…] A momentânea ausência do pai por motivo de viagem na época
dos fatos não desfigura a presunção, denotando falta de maior empenho
paterno na admonição e preparação do filho. Também a não imputabilidade
deste não funciona como excludente da responsabilidade paterna pela
simples razão de que sua fonte é o pátrio poder, abrangendo ela todos os
atos ilícitos que pratique, em qualquer situação, porque a vigilância que lhe
incumbe é universal e contínua, não podendo, pois, pretender que com
relação a determinados atos submetidos a essa vigilância não se configura
sua responsabilidade (RT 651/73). O caso é de responsabilidade objetiva e
não de responsabilidade subjetiva com presunção de culpa, após a entrada
em vigor do CC. A norma comentada imputa responsabilidade aos pais. (In
Código Civil Comentado, 7.ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009,
pág. 812).
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Folha n.: 10
Ainda, no art. 933 do citado código:
Art. 933. As pessoas indicadas nos incisos I a V do artigo
antecedente, ainda que não haja culpa de sua parte, responderão pelos
atos praticados pelos terceiros ali referidos.
O julgador deve estabelecer, para o caso concreto, qual a conduta
que foi determinante para o evento danoso.
No caso, os testemunhos prestados nos autos tanto na fase policial
quanto na judicial afirmam que os menores eram amigos e Thales (filho do requerido)
sempre ficava na casa dos caseiros (autores) quando o requerido Homero (pai de
Thales) tinha de sair e já tinha manuseado arma sob a vigilância do pai. No dia do
fato, o menor Thales estava sob o cuidado dos autores.
Isso é confirmado pelo depoimento de Homero Franco (requerido e
pai de Thales):
[…] o depoente deixou seu filho na propriedade rural na quinta-feira
pela manhã, um dia anterior da ocorrência dos fatos. Era período de férias
escolares e como o depoente necessitava realizar um trabalho de
transporte de animais, deixou-o para os cuidados dos requerentes. Neste
mesmo dia a empregada do depoente entrou em sua casa, que fica próxima
cerca de 600 metros da casa onde moravam os requerentes para realizar a
limpeza, oportunidade em que seu filho lá adentrou e tomou posse da arma
de foto, no entanto o requerente Marcos acompanhou seu filho na casa. O
filho do depoente entrou na casa e pegou a espingarda, tendo-a repassado
para o requerente Marcos. Em oportunidades anteriores, o filho do
depoente já havia utilizado a espingarda, porém na presença e sob
orientação do depoente. Segundo o filho do depoente, o disparo da arma
de fogo foi acidental e ocorreu quando ele descia um degrau do curral.
Dada a palavra a advogada dos requerentes, às reperguntas respondeu: o
depoente comparecia em sua propriedade rural quase todos os finais de
semana e em alguns deles levava seu filho. O imóvel do depoente possuía
duas chaves, sendo que uma delas ficava em sua posse e a outra com a
faxineira. O depoente mantinha apenas a espingarda, que foi utilizada pelo
seu filho, na casa. A espingarda era de calibre ponto 22. A primeira vez
que o filho do depoente manuseou a espingarda ele tinha entre 8 e 9
anos, porém na presença do depoente. O depoente costumava caçar na
propriedade, porém a noite e sem a presença de seu filho. O depoente
confirma o lapso temporal do trabalho realizado pelos requerentes na
propriedade rural, tal como descrito na folha 04 por ocasião dos fatos
ocorridos, os requerentes deixaram de prestar serviços ao depoente, por
alegarem não ser mais possível conviver no lugar onde ocorreu a morte do
filho deles. […] - fl. 204 – grifei.
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Número Verificador: 500022120720118220006814699
Folha n.: 11
Também o depoimento de José Marcos Santos (pai da vítima):
[…] Quem noticiou ao depoente o fato ocorrido foi o próprio filho do
requerido que foi até a casa do depoente, dizendo: “tio, corre lá que eu
atirei no Rangel”. O requerido possui uma casa na propriedade rural, que
também é provida da residência do caseiro, na ocasião ocupada pelo
depoente e sua família. O requerido ia na propriedade rural todos os finais
de semana, sendo que naquele dia o filho do requerido se encontrava
sozinho na propriedade. Na ocasião, o requerido deixou seu filho em
companhia do depoente no dia anterior a tarde, para buscá-lo na sexta-feira
à tarde. O requerido deixou seu filho diretamente com o depoente e a casa
dele ficou fechada, porém no dia seguinte, sexta-feira, pela manhã a
empregada possuía as chaves, entrou na casa para limpá-la, oportunidade
em que o filho do requerido entrou no imóvel e se apossou da arma de
fogo, levando-a para o curral, onde depositou-a no cocho. Quando o
depoente voltou dos afazeres do campo para sua casa, passou pelo curral
e viu as crianças brincando, porém como a arma estava dentro do cocho
não a visualizou. Dada a palavra a advogada do requerido, às reperguntas
respondeu: não é verdadeira a afirmação constante em seu depoimento
perante a autoridade policial de que teria ido até a casa do requerido com a
criança Thales, onde presenciou quando este se apossou do rifle, sendo
que o depoente declara que não fez esta afirmação embora esteja
constando em seu depoimento. O depoente tomou conhecimento que o
filho do requerido iria caçar gavião somente depois do ocorrido, porque ele
falou. O depoente já acompanhou Thales, filho do requerido, juntamento
com este até a represa da propriedade a fim de matarem jacaré. O
depoente nunca caçou sozinho com Thales. […] - fl. 205 – grifei.
Ainda, a declaração de Edmilson Mota de Oliveira (Vaqueiro):
[…] a testemunha frenquentemente comparecia na propriedade,
pertencente ao requerido, com o fim de domar animais. Algumas vezes em que
comparecia na propriedade para realizar o trabalho, encontrava o requerido, outras
vezes não, assim como o filho do requerido. A testemunha nunca viu o filho do
requerido utilizando arma de fogo, embora houvesse comentários nas
redondezas de que ele fazia uso. […] - fl. 203 – destaquei;
A mãe da vítima, Vilma Chaves Santos reportou sua declaração ao
depoimento já externado na fase policial, nos seguintes termos:
[…] que a declarante afirma que desde que passou a trabalhar no
sítio Primavera, o HOMERO passou a sempre deixar o THALIS na casa da
declarante, visto que a declarante tinha um filho único (MARCOS RANGEL)
de idade aproximada à idade do THALIS; que a declarante afirma que ela e
a família tratavam o THALIS como se ele fosse seu próprio filho, inclusive
nunca viu e nem ouviu dizer que houve brigas entre THALIS e o MARCOS
RANGEL; que a declarante afirma que é conhecedora de que o HOMERO é
possuidor de uma arma de fogo do tipo RIFLE, a qual ficava guardada na
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Folha n.: 12
casa dele; que a declarante afirma que o HOMERO tem uma casa no sítio,
onde ele costuma ficar de terça a sexta-feira, inclusive esta casa fica
próxima da casa em que a declarante mora; que a declarante afirma que
é conhecedora de que o THALIS era acostumado a andar pela fazenda
Primavera portando o RIFLE do Homero, bem como a declarante
afirma que o HOMERO nunca se importou com o fato do THALIS andar
de posse do RIFLE; que a declarante esclarece que por diversas vezes já
havia tentado conversar com o THALIS para ele parar de andar com o
RIFLE pelo sítio, todavia ele sempre dizia que era acostumado com o
RIFLE e que iria ficar andando com ele; quanto ao fato ocorrido a
declarante afirma que na quarta-feira pela manhã o HOMERO levou o
THALIS e o deixou na casa da declarante, sendo que o HOMERO voltou
para Ji-Paraná; que a declarante afirma que o THALIS dormiu em sua casa
na quarta-feira. QUE na quinta-feira pela manhã a empregada (INES) da
casa do HOMERO abriu a casa do mesmo, então o THALIS foi até lá e
pegou o RIFLE, sendo que de lá ele já foi para o mato e voltou para
almoçar, sendo que depois do almoço ele pegou o RIFLE e voltou para o
mato; que a declarante esclarece que não viu onde o THALIS guardou o
RIFLE, todavia acredita que foi na própria casa da declarante; que a
declarante afirma que na sexta-feira pela manhã o THALIS levantou e logo
em seguida apareceu com o RIFLE na mão, então a declarante afirma que
pediu ao mesmo para que ele guardasse o RIFLE, porém ele respondeu
com a seguinte frase “NÃO SE ACHA TIA, EU JÁ SOU ACOSTUMADO”,
então ele não guardou o RIFLE, mas a declarante esclarece que não podia
fazer nada em virtude de que o THALIS era o filho do patrão e ela não
poderia ditar ordens para ele, inclusive a declarante afirma que o THALIS é
um menino muito “danado” e não respeita nem o pai dele; que a declarante
esclarece que na sexta-feira pela manhã o THALIS começou a chamar a
declarante para ir vê-lo matar um GAVIÃO, todavia a declarante lhe disse
que não iria, visto que ela não gostava de ver ele matando os “bicinhos”,
sendo que esclarece que mais uma vez pediu que ele deixasse a arma e a
guardasse alegando ainda que não estava vendo nenhum gavião pelas
proximidades, sendo que o THALIS lhe respondeu “PORQUE VOCÊ FICA
PEDINDO PRA MIM GUARDAR A ARMA, VOCÊ SABE QUE EU SOU
ACOSTUMADO COM ELA”; que o THALIS continuou dizendo tem um
gavião por aqui sim e eu tenho que matar ele é hoje, sendo que declarante
ainda fez mais uma tentativa para que ele guardasse a arma (…); que
passados poucos minutos, o THALIS veio correndo e gritando em voz de
desespero, “TIA, TIU, EU ACERTEI O RANGEL”, então o esposo da
declarante lhe perguntou, acertou como THALIS, sendo que ele respondeu
“EU ATIREI NELE”; que nesse instante a declarante e o esposo correram
até o curral e encontraram o filho caído, onde a declarante lhe pegou e o
colocou no colo, (…) que a declarante esclarece que pediu ao THALIS para
ficar lhe ajudando no socorro do MARCOS RANGEL, sendo que o THALIS
ficou lhe ajudando, e o tempo todo o THALIS dizia para o MARCOS
RANGEL, ME PERDOA EU SÓ ATIREI MAS ERA PARA PEGAR SÓ DE
RASPÃO, enquanto seu filho dizia “PORQUE VOCÊ FEZ ISSO AGORA EU
VOU MORRER, E A MINHA MÃE”, […] - fls. 44/46 – grifei.
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Folha n.: 13
Na fase policial, o menor Thales, na presença de seu pai, prestou os
seguintes esclarecimentos:
[…] Que no dia 04.07.2008 o informante estava no sítio de seu pai,
porém o seu pai o deixara no sítio no dia 03.07.2008 e retornara para a
cidade tendo o informante permanecido na casa dos caseiros, aliás isto era
um fato comum, pois sempre que estava no sítio ficava em companhia
deles e sempre se deu muito bem com Marcos, sendo amigos; Que no dia
03.08.2008 Marcos, o caseiro, pediu ao informante que pegasse uma arma
de fogo que o pai do informante possui, sendo uma espingarda cal. 22, pois
ele (Marcos) queria matar uma capivara; Que pegou a arma na casa de seu
pai e levou apara a casa dos caseiros, tendo guardado a mesma naquele
local, no dia seguinte 04.07.2008, não se recorda da hora, mas era na parte
da manhã, o informante pegou a espingarda, cal. 22 e juntamente com
Marcos Rangel foram caçar gavião, passado algum tempo como não tinham
pego nada, resolveram ir jogar bola no curral, tendo o informante deixado a
espingarda em cima de um coxo, brincaram um pouco de bola, mas depois
o informante pediu para pararem de brincar pois estava cansados, então
estavam saindo do curral para irem para casa tendo o informante pego a
arma veio a disparar e acidentalmente atingiu Marcos, na região do
abdomem, tendo o informante de imediato chamado os pais dele; (…)
Perguntado se tinha o costume de pegar a arma e sair para caçar, o
informante disse que sim. (…) Que a arma, tipo espingarda ficava
guardada em uma dispensa, dentro de uma cômoda na casa de seu pai
e como era acostumado a pegar a arma, pois seu pai sempre permitiu
que o informante pegasse a arma e fosse caçar, não acreditou que
teria problemas em pegar a arma na data do fato. Esclarece que quando
pegou a arma seu pai não estava no sítio. [sic.] - fl. 167/168 – destaquei.
Pelos depoimentos prestados, pode-se concluir que, talvez em razão
de se tratar de sítio, é costumeiro o manuseio de arma de fogo e não se pode deixar
de observar que o acesso do menor à espingarda não deve ser atribuído aos autores,
senão ao próprio pai, Homero Franco, que afirmou ter ensinado seu filho a manusear
a arma quando este tinha por volta de 8 anos de idade.
Com isso, muito embora os requerentes estivessem, ainda que de
forma costumeira, cuidando do menor no dia do acidente (já que Thales era filho do
patrão e amigo de seu filho), também estavam em situação de retração em relação
ao comportamento da criança em mexer na arma de fogo, pois, pelo que se vê nos
autos, era normal dito comportamento em razão de se tratar de sítio e ter não só a
ciência do pai, mas a afirmação de que a instrução inicial para o manuseio da
espingarda também foi realizada pelo genitor, ora requerido e patrão dos autores.
Dos depoimentos, se denota que o acontecimento foi um acidente
que causou dor em ambas as famílias, todavia, foram dois menores envolvidos onde
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Folha n.: 14
um teve a vida ceifada e outro carrega a dor de ter disparado uma arma
acidentalmente contra um amigo.
Tivesse o requerido evitado a exposição do filho menor ao contato
com a arma, bem como se houvesse cautela em guardar a espingarda deixando-a
fora do acesso da criança, talvez pudesse não ter ocorrido o triste fato.
Os apelantes, por sua vez, eram empregados do requerido e, embora
tratassem Thales como filho, não tinham autonomia para dar ordens, pois, como
declarado pela mãe apelante, era o filho do patrão e não respeitava o próprio pai,
além de ser costume do requerido, Homero Franco, permitir que seu filho, Thales,
manuseasse a espingarda que resultou na morte acidental do filho dos requerentes,
Marcos Rangel.
Com efeito, por ser do requerido o poder familiar em relação aos atos
praticados por seu filho Thales, ao apelado deve ser atribuída a responsabilidade
pelo dano causado aos apelantes pela morte do filho Marcos Rangel.
Nessa perspectiva, deve-se reconhecer a responsabilidade exclusiva
do requerido pelo ato praticado por seu filho que vitimou o filho dos requerentes,
Marcos Rangel, e que por certo abalou todos os envolvidos, mas muito mais os pais
apelantes que perderam um filho prematuramente e sofrem uma dor impossível de se
descrever e psiquicamente incomensurável.
II – Do Dano Moral
É incontestável que o disparo foi feito pelo filho do requerido que não
cuidou de vigiá-lo e deu acesso à arma de fogo, cujo disparo ceifou a vida do filho
dos caseiros.
Com efeito, ao ser estabelecida a responsabilidade, fica o dever de
indenizar e é claro que não se pode pensar que dinheiro compensará a morte de um
filho. Absolutamente.
Os requerentes sofrem a perda do filho, enquanto que ao requerido
cabe a compensação pelo dano moral pela morte causada acidentalmente por seu
filho e o valor deve ser fixado no sentido de operar-se com moderação,
proporcionalmente ao grau de culpa, à capacidade econômica das partes, cabendo
ao juiz orientar-se pelos critérios sugeridos na doutrina e jurisprudência, com
razoabilidade, valendo-se de sua experiência e do bom senso.
Outrossim, nos termos do artigo 944 do Código Civil, fica
estabelecido em nosso direito que a indenização se mede pela extensão do dano,
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Folha n.: 15
ressaltando-se, ainda, que a fixação da indenização por dano moral deve atender a
um juízo razoabilidade e proporcionalidade. Discorrendo sobre o assunto, oportuna é
a lição de Sérgio Cavalieri Filho em seu Programa de Responsabilidade Civil, 6ª
Edição, Editora Malheiros:
Importa dizer que o juiz, ao valorar o dano moral, deve arbitrar uma
quantia que, de acordo com o seu prudente arbítrio, seja compatível com a
reprovabilidade da conduta ilícita, a intensidade e duração do sofrimento
experimentado pela vítima, a capacidade econômica do causador do dano,
as condições sociais do ofendido, e outras circunstâncias mais que se
fizerem presentes. (fl. 116)
Na hipótese o dano é derivado da morte do filho dos requerentes e o
requerido responde civilmente pelo ato praticado por seu filho, tal como já delineado
neste julgamento.
É fato que a morte de um ente próximo e querido traz sentimentos de
perda e angústia, bem como, das dores que recaem sobre um ser humano, é
daquelas que mais afetam uma pessoa. Claro que uns sentem e reagem à morte de
forma mais racional, outras ficam emocionalmente fragilizadas e sentem mais a
perda.
A morte prematura do filho causa dor impossível de se descrever e é
psiquicamente incomensurável. Há uma inversão da ordem natural da vida e causa
reflexo subjetivo extremamente elevado, de modo que não há dúvida de que nenhum
dinheiro compensará a perda. Este não é o objetivo da indenização por dano moral,
senão a busca por servir de leniência à dor e propiciar condições mínimas de
conforto à família acometida pelo infeliz e trágico acidente.
Ressalto que a reparação por dano moral tem vários objetivos
(pedagógico, punitivo e compensatório), contudo, na sua fixação a condição pessoal
das partes não pode ser ignorada e deve ser devidamente sopesada no momento de
seu arbitramento.
Essa Corte tem como parâmetros para casos similares a quantia de
R$50.000,00 para cada genitor, a exemplo dos julgados: Apelações Cíveis n.
1209441-93.2006.8.22.0005, 0001104-37.2011.8.22.0007 e 0093247-
68.2008.8.22.0001. No STJ, os seguintes precedentes: AgRg no AREsp 105.336/SC,
rel. min. Marco Buzzi, j. 19/06/2012/R$105.000,00; REsp 1249484/MS, relª. minª.
Nancy Adrigi, j. 15/05/2012/R$100.000,00; AgRg no AREsp 1.678/PE, rel. min.
Benedito Gonçalves, j. 28./02/2012.
Evidencia-se ainda que a indenização, além da extensão do dano,
deve considerar o aspecto da capacidade financeira do causador do dano e, no caso,
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Folha n.: 16
em observância aos parâmetros estabelecidos por esta Câmara, bem como com
vistas a evitar enriquecimento sem causa de uma parte ou empobrecimento de outra,
mas tão somente uma possível compensação representada por valor a servir de
lenitivo ao dano sofrido, entendo que é adequado o valor de R$50.000,00 para cada
um dos autores.
Assim, o valor da indenização por dano moral deve ser fixado em
R$50.000,00 para cada um dos autores, corrigido a partir do julgamento desse
acórdão (Súmula 362 do STJ) e com juros a partir do evento danoso (Súmula 54 do
STJ e art. 398 do Código Civil).
III – Da Pensão Alimentícia
Os apelantes também buscam a concessão de pensão mensal em
razão da presunção de que o menor viesse a contribuir para o orçamento familiar.
Consoante entendimento sedimentado na jurisprudência do Superior
Tribunal de Justiça, com regra, a pensão mensal pela morte de filho menor que não
exercia atividade remunerada deve ser estimada em 2/3 do salário mínimo, até que o
filho viesse a completar 25 (vinte e cinco) anos de idade e, a partir daí deve ser
reduzida para 1/3 do salário, haja vista a presunção de que a vítima constituiria seu
próprio núcleo familiar, até a idade em que a vítima completaria 65 (sessenta e cinco)
anos.
Sobre o assunto a orientação jurisprudencial:
RESPONSABILIDADE CIVIL. ACIDENTE DE TRÂNSITO COM
MORTE. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS
PROPOSTA PELOS PAIS DA VÍTIMA. RECURSO ESPECIAL DOS
AUTORES. 1. MAJORAÇÃO DO VALOR DA INDENIZAÇÃO POR DANOS
MORAIS. POSSIBILIDADE. 2. PENSIONAMENTO. TERMO FINAL. 3.
RESPONSABILIDADE EXTRACONTRATUAL. JUROS MORATÓRIOS.
TERMO INICIAL. DATA DO EVENTO DANOSO. SÚMULA 54/STJ.
RECURSO ESPECIAL DO RÉU. 4. INDEPENDÊNCIA DAS ESFERAS
CRIMINAL E CIVIL. 5. PROVIMENTO DO RECURSO DOS AUTORES.
1. Trata-se de ação de indenização por danos materiais e morais
decorrentes do falecimento de filho dos autores, vítima de acidente de
trânsito causado por culpa do réu, caso em que a condenação por danos
morais deve ser majorada, observando-se os princípios da
proporcionalidade e da razoabilidade.
2. Segundo a jurisprudência deste Tribunal, é devido o
pensionamento aos pais, pela morte de filho, nos casos de família de baixa
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Folha n.: 17
renda, equivalente a 2/3 do salário mínimo ou do valor de sua remuneração,
desde os 14 até os 25 anos de idade e, a partir daí, reduzido para 1/3 até a
data correspondente à expectativa média de vida da vítima, segundo tabela
do IBGE na data do óbito ou até o falecimento dos beneficiários, o que
ocorrer primeiro. No caso, tendo os recorrentes formulado pedido para que
o valor seja pago até a data em que o filho completaria 65 (sessenta e
cinco) anos, o recurso deve ser provido nesta extensão, sob pena de
julgamento ultra petita.
3. Na hipótese de responsabilidade extracontratual, os juros de
mora são devidos desde a data do evento danoso (óbito), nos termos da
Súmula 54 deste Tribunal.
4. Consoante a jurisprudência desta Corte, a absolvição no juízo
criminal, diante da relativa independência entre as instâncias cível e
criminal, apenas vincula o juízo cível quando for reconhecida a inexistência
do fato ou ficar demonstrado que o demandado não foi seu autor.
5. Recurso especial dos autores provido e improvido o do réu.
(REsp 1421460/PR, rel. min. Marco Aurélio Bellizze, Terceira Turma, julgado
em 18/06/2015, DJe 26/06/2015 – grifo nosso).
Ressalto que o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE
publicou a nova tabela de expectativa de sobrevida, cuja idade média passou dos
atuais 75,2 anos para 75,5 anos de idade, aplicável a partir de 5 de janeiro de 2017 e,
no caso, a parte busca na petição inicial a fixação de pensão até 70 (setenta) anos (fl.
12).
Assim, a indenização pelo dano material deve seguir a mesma
orientação constante no julgado citado, com a atualização da tabela do IBGE e
limitado ao pedido inicial, razão pela qual fixo o pagamento de pensão mensal para
os requerentes no importe conjunto de 2/3 do salário mínimo a ser pago desde a data
do evento até a data em que a vítima completaria 25 (vinte e cinco) anos de idade e,
a partir daí, reduzido para 1/3 do salário até o óbito dos beneficiários da pensão ou
da data em que a vítima completaria 70 (setenta) anos de idade, conforme pedido na
inicial.
As prestações vencidas deverão ser pagas em parcela única, após
serem convertidas em valores líquidos à data do vencimento - considerando o valor
vigente à época - e então serem atualizadas monetariamente pela tabela de
atualização desta Corte, com incidência de juros moratórios de 1% a partir do evento
danoso (art. 398 do CC e Súmula 54 do STJ), até a data do presente julgamento em
que se dá a condenação. Nas prestações vincendas, deverá ser observado o valor do
salário mínimo vigente à época do pagamento (Súmula 490 do STF).
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Folha n.: 18
IV – Da Constituição de Capital
Aprecio neste momento o pedido dos apelantes de constituição de
capital.
Dispõe o atual CPC/73 em seu art. 533 (CPC/73, art. 475-Q) que
quando a indenização por ato ilícito incluir prestação de alimentos, cabe ao
executado constituir capital, cuja renda assegure o pagamento do valor mensal da
pensão, ao passo que o §1º do mesmo artigo prevê que este capital, representado
por imóveis ou por direitos reais sobre imóveis suscetíveis de alienação, títulos da
dívida pública ou aplicações financeiras em banco oficial, será inalienável e
impenhorável enquanto durar a obrigação, podendo constituir-se em patrimônio de
afetação.
A interpretação do STJ sobre o assunto anteriormente previsto no art.
475-Q (CPC/73) já havia sido firmada nos termos da súmula 313:
Em ação de indenização, procedente o pedido, é necessária a
constituição de capital ou caução fidejussória para a garantia de pagamento
da pensão, independentemente da situação financeira do demandado.
(Súmula 313, Segunda Seção, julgado em 25/05/2005, DJ 06/06/2005, p.
397)
Existindo o pedido da parte, o juiz será obrigado a determinar a
constituição do capital e, se houver resistência da parte em constituir o capital,
caberá a aplicação de astreintes, a fim de pressionar o cumprimento. Ao ser cumprida
a obrigação alimentar, o capital constituído será liberado.
Na espécie, a constituição de capital afigura-se necessária na medida
em que garante que os autores recebam a prestação alimentícia devida pela morte
de seu filho e, ao término do pagamento, a garantia poderá ser liberada.
V – Das Verbas de Sucumbência
Em observância à regra disposta no código de processo civil vigente
à época da prolação da sentença, bem como em razão do reconhecimento da
procedência do pedido inicial, inverto o ônus de sucumbência para condenar o
requerido ao pagamento das custas processuais e honorários de advogado no
montante de 10% sobre os valores fixados a título de dano moral e prestações
vencidas e doze vincendas da pensão fixada, a ser corrigido a partir do presente
julgamento.
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Folha n.: 19
VI – Dispositivo
Considerando todo o acima exposto, dou provimento ao recurso de
apelação dos autores para:
1 – reconhecer a responsabilidade civil do requerido Homero Franco
pelo ato causado por seu filho que vitimou o filho dos requerentes.
2 – a título de dano moral condenar o requerido ao pagamento de
R$100.000,00, sendo R$50.000,00 para cada um dos autores, corrigido a partir do
julgamento desse acórdão (Súmula 362 do STJ) e com juros a partir do evento
danoso (Súmula 54 do STJ e art. 398 do Código Civil);
3 – fixar o pagamento de pensão mensal para os requerentes no
importe conjunto de 2/3 do salário mínimo a ser pago desde a data do evento até a
data em que a vítima completaria 25 (vinte e cinco) anos de idade e, a partir daí,
reduzido para 1/3 do salário até o óbito dos beneficiários da pensão ou da data em
que a vítima completaria 70 (setenta) anos de idade, conforme pedido na inicial. As
prestações vencidas deverão ser pagas em parcela única, após serem convertidas
em valores líquidos à data do vencimento - considerando o valor vigente à época - e
então serem atualizadas monetariamente pela tabela de atualização desta Corte,
com incidência de juros moratórios de 1% a partir do evento danoso (art. 398 do CC e
Súmula 54 do STJ), até a data do presente julgamento em se dá a condenação. Nas
prestações vincendas, deverá ser observado o valor do salário mínimo vigente à
época do pagamento (Súmula 490 do STF).
4 – determinar ao requerido a constituição de capital para garantir
que os autores recebam a prestação alimentícia devida pela morte de seu filho,
sendo que, ao término do pagamento a garantia poderá ser liberada;
5 – inverter o ônus da sucumbência para condenar o requerido ao
pagamento das custas processuais e honorários de advogado no montante de 10%
sobre os valores fixados a título de dano moral e prestações vencidas e doze
vincendas da pensão fixada, a ser corrigido a partir do presente julgamento.
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