O amor de predileção de Jesus pelos pobres é, certamente, a maior acentuação que encontramos nos Evangelhos. Ele fez e ensinou. E para que os destinatários o entendessem melhor, contou diversas parábolas. O evangelista Lucas em 16,19-31 nos deixa a parábola do rico e do pobre. O indigente Lázaro, nem mesmo podia chegar perto da mesa onde o rico, Epulão, se banqueteava, para recolher as migalhas que caiam da mesa.
Ambos morreram. Não sabemos qual deles morreu antes. O que sabemos é que foram para lugares bem diferentes: o pobre foi para o céu; o rico para o inferno. E do inferno o rico teve a oportunidade de ver Lázaro em total felicidade no céu. Pediu uma gota de água; depois pediu que sua família fosse avisada para que mudasse de comportamento, caso contrário iriam todos queimar no inferno. Nem este favor foi possível prestar. Vale a pena ler toda a parábola.
Como está a realidade do nosso povo atualmente? Há algumas semanas um canal de televisão noticiou na mesma noite os seguintes fatos: uma mulher exibiu seu gato ricamente vestido. Custo da roupa: cinco mil reais. Em seguida veio a outra notícia: A ONU publicou um dos seus relatórios onde afirma que duzentos e cinco milhões de latino-americanos vive ganhando apenas dois dólares por dia, o equivalente a um pouco mais de sessenta reais por mês.
É o Lázaro e o Epulão dos nossos dias. É chocante! É escandaloso!. Gato, cachorro e outros animais, merecem, sim, bom trato. Existe até uma sociedade protetora dos animais. Nada contra. Mas, vale a pergunta: onde está a sociedade protetora dos humanos? Existe? Dizem que sim. Mas, onde está seu serviço? Como pode permitir que haja clínicas, hospitais, hotéis de alta sofisticação, até mesmo modistas para desenhar e costurar roupas para animais e pouco ou quase nada faz para que os humanos se vistam decentemente, tenham moradias, mesa farta, hospitais públicos de alta qualidade como merecem os humanos?
A globalização da economia leva uma pequena parcela da sociedade a vestir animais com roupas de luxo, a se banquetear com ricos e variados alimentos, servidos em pratos até mesmo importados. Torna-se urgente a implantação da globalização da solidariedade. Esta tem a marca do amor; ensina a partilhar, a curar as feridas dos duzentos e cinco milhões de latino americanos que estão perto da mesa, mas estão proibidos de assentar-se a ela porque a outra globalização prima pelo egoísmo, pela concentração que geram exclusão, gera lázaros.
Semana santa é tempo para refletir sobre esta realidade. Na Semana santa Jesus convidou seus amigos pobres para a Ceia e mandou que esta ceia fosse celebrada em sua memória. Fazer memória de Jesus é multiplicar mesas bem abastecidas para que nelas todos se alimentem. É transformar o mundo para que não haja mais gastos com gatos vestindo roupas de cinco mil reais e duzentos e cinco milhões de pessoas vivendo na fome.
Feliz Páscoa!
- D. Antonio Possamai, bispo da Diocese de Ji-Paraná.
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