De repente, não mais que de repente, bateu o desespero. Urge encontrar uma saída para tentar escapar do futuro melancólico, tenebroso e humilhante que agora tenho certeza que me espera. De repente a imagem da minha velhice miserável apareceu-me diante dos meus olhos com uma nitidez espantosa e uma riqueza de detalhes indescritível – e pior -, na mesma proporção em que desapareceram todas as dúvidas sobre a inexorabilidade desse destino deplorável. Preciso, urgentemente, cobrar de mim mesmo uma providência, pensar em alguma coisa, tomar uma decisão e começar a arregaçar as mangas, porque acabo de descobrir que, como jornalista e funcionário público, meu futuro é para lá de indigente, medonho e doloroso.
Com um clique, mudo rapidamente a tela do computador, viajando do site em que li a notícia que me trouxe a certeza dos meus dias sombrios para algum endereço que me possa dar uma luz, sugerir uma deixa, qualquer coisa que possa me livrar dessa depressão que, daqui por diante, adivinho profunda, permanente e progressiva. Leio, na página de Internet onde ainda atordoado fui parar que o escritor Paulo Coelho é um sucesso só nos dois maiores países asiáticos. Na Rússia, lidera as listas de vendas em livrarias. E na China, é número 1 na lista da “Dangdang”, a maior livraria de vendas on-line do país.
Olha aí um sinal. Procuro mais detalhes num site de busca e sou informado de que esse desempenho do escritor brasileiro nestes gigantes asiáticos é pinto diante do balanço global dos seus empreendimentos editoriais – traduzido em 66 idiomas, consumido em mais de 160 países e com mais de 100 milhões de exemplares vendidos mundo afora. Sem dúvida alguma, eis aí um bom negócio. De escrever eu já vivo, Paulo eu já sou, só me falta ser Coelho. Esse é o problema. Ficou sabendo ainda que até chegar a Paulo Coelho o Mago travou uma batalha desesperada contra inimigos cruéis, tendo sobrevivido, principalmente, porque tinha o sonho inabalável de se tornar um escritor conhecido.
2 – ESCRITOR FALIDO
É. Não parece ser o meu caso. Considerando que em mais de 30 anos de atividade minhas únicas incursões na literatura são um prefácio num livro de poesias de um escritor de Baturité (CE) que, decepcionado com a obra, tocou fogo na edição e morreu no incêndio decorrente (disseram que não foi possível concluir se foi suicídio ou um acidente provocado pela imperícia de um incendiário de primeira viagem), além de um conto – “A Galharufa Encantada” - encomendado por uma editora de Catolé do Rocha (PB) que faliu com a publicação da coletânea “Novos Contistas Proletários Militantes na Imprensa”, fico meio desanimado.
Quanto a esta iniciação literária algo inusitada, acho que o problema foi com o título do livro. Insisti com o editor para não incluir aquele “Novos”, deixar apenas “Contistas Proletários Militantes na Imprensa”. Argumentei que “Novos” passaria primeiro a idéia de “desconhecidos”, mas ele insistiu que o público seria atraído pela conotação de “novidade”. Resultado: apenas 234 exemplares chegaram à praça – 120 distribuídos para os 12 contistas (10 para cada), 50 encaminhados para divulgação, 30 para a Academia Catoleense de Letras e 20 para a biblioteca de igreja. Ou seja, resultaram vendidos 14 livros. Faliu.
Salto para outra página e dou de cara com uma notícia de que as Farc (Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia) teriam encontrado nos diamantes da reserva indígena Roosevelt uma nova fonte de financiamento das suas atividades. O desespero é tanto que consigo enxergar aí logo duas alternativas para minha aflição – cair no garimpo ou entrar para a guerrilha. Não resta dúvida. Qualquer escolha que fizer deverá resultar em algo infinitamente menos penoso do que o futuro pavoroso que me espera. Como se sabe, os diamantes retirados da reserva são de altíssima qualidade e valem muito. Só para se ter uma idéia, a área permitiria a instalação de uma mina industrial de diamante com capacidade para produzir um milhão de quilates de pedras preciosas por ano.
3 – SEM CORAGEM
Só aí se avalia que a receita estimada por tal exploração equivaleria a US$ 500 milhões anuais. Claro que, no muque, passando a bateia, não ia conseguir tudo isso. Mas com um pouco de sorte, faria um bom pé de meia com que escapar do meu destino atroz. Nas Farc teria a perspectiva de tornar-me uma espécie de “Che” entre os colombianos, na hipótese – sempre provável – da guerrilha chegar ao poder. Convém não esquecer que o “Guevara” foi ministro e presidente do Banco Central em Cuba. O “Che Queiroz” – ou ficaria menos ridículo “Che Bezerra”? - pararia por aí.
Evidente que tanto no garimpo como na guerrilha sempre haverá o risco da morte iminente. Mormente depois que os Cinta-larga aprenderam como executar um garimpeiro no capricho – depois de 29 experiências bem sucedidas. No caso das Farc, consta que a guerrilha vem sofrendo um golpe atrás do outro. De qualquer modo, uma morte gloriosa em busca de fama e fortuna é bem mais estimulante do que um futuro inescapavelmente amargo e funesto. O problema aqui é a coragem. Como viver embrenhado nas selvas com um medo doentio de inseto e escuridão? Não dá. Melhor pensar em outra coisa.
O diabo é que a emergência da situação tumultua o pensamento e as idéias que se sucedem resultam cada uma mais desastrada do que a outra. Fazer o que? Jogar na megasena acumulada por umas 20 semanas? Assaltar a Casa da Moeda? Teria que ser algo nessa magnitude, porquanto a essa altura nem um emprego de diretor do Senado resolve.
Ah, sim! O considerado quer saber, claro, a razão de tanta ansiedade. Companheiro, o negócio é sério. A notícia que me deixou nessa prostração diz respeito ao ex-governador Jerônimo Santana, cuja miserável situação resultou numa campanha de arrecadação de esmolas para ajudá-lo. Ora, se Jerônimo Santana – três vezes deputado federal, prefeito da capital e governador do Estado - está vivendo da caridade alheia, imagine o fim que estará reservado para um pé-rapado como eu? Só de pensar eu caio no choro. E agora?