Sábado à tarde, banho no cachorro, aparar a grama do jardim, rancho da semana, afazeres prazerosos depois de uma semana corrida atrás da “grande” notícia. Aquela que vai fazer a diferença.
*Vou ao centro da cidade com a família. Na volta, subo pela avenida D. Pedro II, quando passo em frente ao Conselho Regional de Odontologia. Diversos homens e mulheres de branco me chamam a atenção. São dentistas. Por instinto procuro a figura de meu pai.
*Ele freqüentou por mais de três anos o curso de especialização em ortodontia neste local. É ai que eu me encontrava com ele, quando estava em Porto Velho. Milésimos de segundos, é o que dura este devaneio. Ele não está mais entre nós.
*Deste momento até o final do dia, sua lembrança fica na memória. Mais forte que em outros dias.
*Lembro do seu modo de assobiar, de cumprimentar e abraçar a gente (filhos). Seu jeito de nos observar, da sua figura paterna, todo de branco, sorriso franco.
*Suas piadas que tanto me faziam rir. Parece estranho, mas não me lembro de mais nenhuma.
*Chegando em casa, reencontro com meu velho, fiquei com boa parte de seus livros. Uma biblioteca bem eclética.
*A maioria de seus livros tem anotações pessoais sobre o tema. É como se eu conversasse com ele. Todas redigidas com sua caneta tinteiro ParKer, companheira inseparável de mais de vinte anos.
*Passados quase dois anos de seu assassinato, um misto de saudade e revolta me assalta todos os dias.
*Tenho saudade, banzo mesmo. Quando estou sozinho, lendo, deitado ou no volante do carro, sinto as lágrimas brotarem. Aprendi não ter vergonha delas. Deixo que caiam.
*Revolto-me com a ineficiência da polícia acreana. Um crime de extrema simplicidade de se resolver. Sou impulsivo , dá vontade de ir lá, onde o avião faz a curva e resolver a parada... Resigno-me, cabe a Deus fazer justiça! Na justiça e polícia acreana não acredito mais.
*Entro no quarto com os olhos vermelhos e marejados. Vejo Luis, meu filho de apenas 3 meses que o avô não conheceu. Ele na sua inocência, ri para mim. Acha graça de tudo. Volto ao centro. Recomponho-me.
*Quando chegar segunda-feira, começa tudo de novo. A corrida atrás da grande história. Tem dias que não posso segurar as lágrimas.Não consigo e nem quero. Os companheiros de redação que me desculpem.
*Meu pai foi assassinado no dia 14 de setembro de 2004 e até hoje as "autoridades" acreanas não resolveram o caso, que só tem um suspeito.
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