Depois de anos trabalhando na cidade, um indígena começa a questionar a sua vida enquanto a filha se prepara para ingressar na faculdade de Medicina
Foto: Divulgação
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A Febre acompanha Justino (Regis Myrupu), um índio de Manaus, Amazonas que há 20 anos vive na cidade grande, trabalhando agora como segurança no porto local. Sua filha Vanessa (Rosa Peixoto) trabalha em um posto de saúde e acaba de passar para a faculdade de Medicina, na Universidade de Brasília. Insegura entre seguir seu sonho e deixar seu pai, ela precisa ainda lidar com uma estranha febre que subitamente aparece. Paralelamente, uma série de estranhos ataques a animais ganha destaque na TV local.
Veja a crítica
"O homem branco só consegue ver o que está diante dos seus olhos". É baseado nesta frase que o conceito de A Febre é desenvolvido pela diretora Maya Da-Rin, a partir da interface física entre as culturas indígena e ocidental associada aos mistérios insondáveis da vida, aqui representada através da floresta amazônica. O resultado disto é um filme multicultural, como poucas vezes se viu no cinema brasileiro.
Isso porque, geralmente, o índio é retratado no cinema pelo seu viés ora histórico ora documental, poucas vezes explorando suas peculiaridades em uma trama ficcional. A Febre investe firme neste sentido, seja dando aos seus personagens principais o poder da fala em seu dialeto nativo - sim, este é um filme brasileiro com legenda - ou mesmo ao refletir suas necessidades no mundo atual, seja através do protagonista Justino (Regis Myrupu, carismático) ou de sua filha Vanessa (Rosa Peixoto, correta). Ele vive na cidade grande há 20 anos, sem o devido reconhecimento, e demonstra um certo cansaço; ela acaba de passar na concorrida seleção para cursar Medicina longe de casa, em Brasília. Ou seja, a separação é iminente.
Se Vanessa demonstra vontade em adentrar de vez no mundo dos brancos, como seus parentes volta e meia ressaltam, Justino sente um certo banzo que é amplificado pela visita de parentes próximos. As sequências onde a família surge reunida, cada um representando seus pontos de vista tão distintos entre quem optou por permanecer na floresta e por viver longe dela, é de uma riqueza cultural impressionante, pela permissão em adentrar um mundo quase secreto, próprio apenas deles. Como consequência, tal opção torna também o filme mais vagaroso, já que compreender o estilo de vida é mais importante do que propriamente grandes feitos.
Soma-se a isso a habilidade em construir sequências misteriosas em torno da floresta, explorando bem sua característica como mata fechada e densa, associada ao bom uso de efeitos sonoros. A fotografia de Barbara Alvarez consegue ainda captar momentos típicos de Manaus, onde asfalto e floresta convivem basicamente no mesmo ambiente, o que auxilia bastante em uma narrativa como esta, que explora tal dualidade a todo instante.
Vale destacar também o bom uso dos programas televisivos como meio de transmitir recados acerca do momento retratado, de início como se fosse um coadjuvante sem importância para, aos poucos, ganhar a dimensão necessária junto aos personagens principais.
De ritmo necessariamente lento, A Febre é um filme bastante interessante pelo olhar dado a uma minoria que sofre preconceito de ambos os lados, no sentido de valorizar suas angústias e seu modo de pensar. De certa forma, é quase um estudo antropológico nesta tentativa de entender e respeitar o olhar do outro, sob o formato de cinema.
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