Margens de Rondônia – Por Aleks Palitot

Margens de Rondônia – Por Aleks Palitot

Foto: Divulgação

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Do que falam as margens? O que revelam? Ou ocultam? Fala-se delas ou elas? Dos discursos historiográficos que tratamos pouco importa trocar as margens de lugar. Não se trata de inverter ou eleger centros e periferias da história. A questão estaria menos no local – espaço geográfico – mas, sim, no papel ocupado por algumas narrativas e seus cenários num determinado discurso historiográfico, que nacional, homogêneo e hegemônico.

Rondônia é a cristalizada por culturas que nasceram no berço dos seus rios, e aqui, somos agraciados pelos rios Madeira, Mamoré e Guaporé, e como uma tríade, uma Santíssima Trindade, proporcionaram no passado, o ingresso dos sertanistas, a sobrevivência dos nativos, e no presente a permanência de algumas comunidades caboclas e tradicionais.

E os rios têm seus senhores e também seus servos. Sociedades indígenas reinventam-se como no Mamoré e Pakaas. Podemos, assim, percorrer os desvãos das corredeiras do Madeira e da vida de índios que por ali ainda existem. Ritos e sons dos rios confundem e são confundidos com as experiências de indígenas e setores envolventes. O Guaporé ganha vida histórica. Como a Amazônia, ele também é inventado como região, espaço geoecológico. Dele expulsa-se a história. Mas a recuperamos nos relatos de conquistas. O silenciado e o enfatizado se invertem. Menos mediação da natureza e, sim, expectativas e percepções. E de carne e osso, sangue e coração. São povos como os quilombolas de Santa Fé e Santo Antônio das Pedras Negras no Guaporé refazendo o contato colonial, suas identidades e, portanto, a si mesmos. O Outro paulatinamente reinventa o Nós. E ambos mudam. Desejos da conquista e colonização são escravos das canoas, e estas dos rios.

Ao tentar fazer alusão a grande aventura de navegar pelo vasto desconhecido da Amazônia, passado este, vivido pelos bandeirantes e sertanistas, encontramos, não apenas um grande desafio, mas no presente, uma enorme sintonia com a natureza envolta pelos seus rios de uma beleza que somente quem vive na Amazônia poderia entender. Por alguns rios que naveguei em meu caiaque, pude não apenas viver uma nobre aventura, mas pude sentir e imaginar as dificuldades enfrentadas no passado, pelos navegantes que desafiaram primeiro a grande floresta de Rondônia. Estes nos deixaram no presente, a Amazônia, inexplorada em quase sua totalidade, embora por aqui, a história nos diz, passaram os destemidos pioneiros. Estes enfrentaram, problemas bem maiores para fazer valer a presença do homem neste recanto do planeta.  Naveguei com minha modesta embarcação da aventura, pelo Rio Madeira, o majestoso e perigoso Madeira, e assim consegui mensurar de perto o quando devemos respeitar a força de suas águas, a força de suas lendas e a energia de seu curso. Senti o calor da emoção de navegar no encontro do Rio Beni e Mamoré entre Guajará-Mirim e Nova Mamoré, onde a fronteira não é apenas representada por um detalhe geográfico, mas, sim pela diversidade da cultura, história e natureza. Conheci também o encontro da águas do Pacaas e Mamoré. Rios distintos que não se misturam, mas são homogêneos no que tange a harmonia da Amazônia e seu enorme ecossistema.

O que falar então do Rio Guaporé? Palco de batalhas entre portugueses e espanhóis no século XVIII, que disputavam no passado a posse do lugar, em virtude das riquezas da Amazônia Guaporeana, sendo estas: o ouro e as drogas do sertão. Hoje, a disputa é exercida pelos pássaros, animais selvagens, peixes e bôtos, onde a procura por um território por tais espécies, geram uma busca incessante pelo demarcar e defender,  palmo a palmo,  o seu espaço na floresta. Se no passado o Eldorado era sinônimo de ouro e prata para os colonizadores, para nós, que vivem em Rondônia, o verdadeiro eldorado é uma esmeralda, verde e polida. O nosso Eldorado é o verde da Amazônia, e essa; de maneira sustentável, devemos explorar e defender. 

Em muitos artigos e manuais – o que se passou chamar de Amazônia foi verdadeiramente expulso. Uma expulsão histórica, uma cada vez historiográfica. Inventada como região – unida e homogeneizada – a Amazônia foi transformada num mundo distante. Da história distante, mas próxima da natureza. Reintegrar estes mundos não é tão-somente um esforço bem intencionado ou politicamente correto de compreender o regional. Significa entender a construção de ima(r)gens naquilo que nomeamos Amazônia, experiências não foram miméticas ou variáveis passivas de mundos dela distantes, mas ligados pelo cultura e viver dos seus rios.

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