*A Polícia Federal começa hoje a entrar nas fazendas dos arrozeiros localizadas no chamado “cinturão de arroz” dentro da reserva Raposa Serra do Sol. O objetivo é fazer o levantamento das benfeitorias existentes nessas fazendas para que os proprietários possam ser indenizados e retirados da terra indígena.
*Mais de 300 homens da Polícia Federal estão acompanhando a equipe técnica do Incra (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária) e da Funai (Fundação Nacional do Índio), que está procedendo às medições dos terrenos e benfeitorias existentes.
*O clima na região é tenso. Ontem os agentes estavam na Vila Surumu, em Pacaraima. Durante a madrugada, pessoas ainda não identificadas chegaram a tentar tocar fogo na ponte de madeira que liga Pacaraima a Vila Surumu, mas o fogo foi logo controlado causando poucos danos ao local.
*A Folha esteve na vila durante a tarde de ontem. O local estava totalmente tomado por policiais federais, que fecharam as principais vias de acesso à comunidade, por medida de precaução. A PF quer evitar que ocorram problemas de indígenas tentando fazer agentes federais como reféns em represália a desintrusão.
*RESISTÊNCIA - Na maioria das casas os moradores não queriam autorizar a vistoria das propriedades, mas, apesar disso, segundo estimativa dos técnicos, cerca de 40 residências foram medidas e tiveram suas benfeitorias avaliadas.
*Na última casa da avenida principal da vila, próximo à Missão Surumu, a professora Moraci de Sousa Carneiro juntou amigos e vizinhos e tentou evitar a entrada dos técnicos e dos federais. Um negociador da PF conversou com a moradora e explicou as razões do levantamento, mas ela, bastante revoltada, afirmava que eles só entravam com mandado judicial.
*“Na minha casa ninguém entra, só com ordem do juiz. Na hora em que chegar com a ordem não tem confusão. Prontamente eu aceito que entrem e revistem tudo. Na Missão da Igreja, que fica aqui do lado, está cheio de estrangeiro e ninguém vai vistoriar. Eu sei que a Polícia Federal não tem culpa, mas eu não aceito. Eu sou filha daqui, não invadi, não roubei, não matei. Eu nasci e me criei aqui e sei que é uma coisa errada o que está acontecendo”, disse.
*O mediador da Polícia Federal explicou à moradora que a casa dela tem a garantia de inviolabilidade de domicílio, mas no terreno os policiais poderiam entrar. “A polícia está aqui para dar apoio à Funai e ao Incra. Ninguém está usando a força, pois viemos aqui para dialogar. O direito à propriedade tem um limite, e desapropriação para fins de reforma agrária é um deles. O decreto está em vigor e o Estado pode ingressar na propriedade desde que não viole o domicílio”, disse.
*No final da discussão, descobriu-se que a professora tinha certidão de índia e sua propriedade não precisou entrar no levantamento.
*FUNAI - O representante da Funai, Phelipe Pheniati, disse que os técnicos estão encontrando dificuldade em fazer o levantamento. “O ideal é quando o ocupante nos acompanha no levantamento para nos mostrar tudo o que tem na propriedade para fazermos um laudo justo. Entretanto, aqui na Vila Surumu, muitos ocupantes recusaram a nos acompanhar e a gente tem que ficar adivinhando o que eles têm de benfeitoria. Isso é muito ruim para o laudo”, disse.
*“Em relação aos índios, a gente não vai fazer o levantamento de nenhuma pessoa indígena porque a Funai nunca vai retirar nenhum índio de terra indígena, que isso não faz sentido”, complementou Phelipe Pheniati.