Advogado é condenado por se apropriar de dinheiro de cliente

De acordo com a vítima, toda a vez que ele perguntava ao advogado pela ação, ele recebia como resposta “Tá andando” até ser avisado pelo mesmo de que perderam a ação.

Advogado é condenado por se apropriar de dinheiro de cliente

Foto: Divulgação

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O juízo da 2ª Vara Criminal de Porto Velho condenou a 4 anos e seis meses de prisão, o advogado Pompílio Nascimento de Mendonça, por se apropriar indevidamente de dinheiro do próprio cliente.

 

Segundo a denúncia, o advogado se apropriou dos valores (pouco mais de R$ 45 mil) de três alvarás judiciais, referentes a uma Ação Civil Pública, que beneficiava Anderson Pereira dos Santos, contra o Banco Santander.

 

A condenação foi com base no artigo 168, § 1º, inciso III, do Código Penal (três vezes), na forma do artigo 69 (apropriação indébita em razão da profissão). O regime de cumprimento da pena será o aberto.

 

De acordo com a vítima, toda a vez que ele perguntava ao advogado pela ação, ele recebia como resposta “Tá andando” até ser avisado pelo mesmo de que perderam a ação.

 

Anderson só veio descobrir a farsa por si próprio, em 2016. Descobriu também que o advogado que contratou e confiou já foi condenado em outra ação criminal, por posse de droga para uso pessoal (artigo 28, caput, da Lei 11.343/2006).

 

CONFIRA A SENTENÇA:

 

S E N T E N Ç A

 

O MM. Juiz de Direito, Edvino Preczevski, titular deste Juízo, prolatou a seguinte

sentença: "Vistos etc. I – R E L A T Ó R I O. O Ministério Público deste Estado, através de

um dos seus membros, denunciou Pompílio Nascimento de Mendonça, qualificado nos

autos em epígrafe, por infração ao artigo 168, § 1º, inciso III, do Código Penal (três

vezes), na forma do artigo 69, do mesmo Código, porque, segundo a inicial, valendo-se

da sua profissão de advogado, o acusado apropriou-se, indevidamente, em 03 (três)

ocasiões distintas, nesta Capital, das quantias de R$ 11.235,22 (1° fato-29/08/2013), R$

2.344,08 (2° fato-10/12/2013) e R$ 31.520,00 (3º fato-10/06/2015), pertencentes ao seu

cliente, ora vítima, Anderson Pereira dos Santos. Conforme restou apurado, enquanto

exercia a profissão de advogado do ofendido, nos autos da Ação Cível n° 1003993-

71.2012.8.22.0601, o acusado recebeu os valores referentes aos Alvarás Judiciais nºs

554/2013 (1º fato), 824/2013 (2º fato) e 372/2015 (3° fato) e não os repassou ao seu

cliente/vítima, apropriando-se, indevidamente. A denúncia, informada com o respectivo

inquérito policial, foi recebida no dia 18/05/2017 (v. fl. 38). O acusado foi pessoalmente

citado (v. certidão, de fl. 40). Resposta à acusação consta às fls. 41/45. O processo foi

saneado e deferida a produção da prova oral especificada pelas partes, designando-se

audiência de instrução e julgamento (v. fl. 47). Foram inquiridas a vítima e a testemunha,

bem como o acusado interrogado (v. mídias digitais, de fls. 62 e 67). Em alegações finais

o Ministério Público requereu a condenação do acusado, nos termos da denúncia (v. fls.

68/70). A Defesa sustentou, em preliminar, inépcia da denúncia, litispendência e

incompetência técnica material do juízo criminal. No mérito requereu a improcedência da

denúncia, com fundamento no artigo 386, inciso III, do Código de Processo Penal, ou

seja, por atipicidade penal das condutas imputadas. Ainda, subsidiariamente, pediu a

fixação das penas nos patamares mínimos e o reconhecimento da atenuante da confissão

espontânea, bem como a suspensão condicional da pena. É o relatório. Decido. II – F U

N D A M E N T A Ç Ã O. II – 1. Questões deduzidas em preliminar. À exceção da

alegação de litispendência, as demais questões deduzidas em preliminar, na verdade,

foram objeto de análise e rejeição no despacho saneador (v. fl. 47). CONTUDO, passo a

reexaminá-las, evitando, com isso, futura alegação de deficiência na prestação

jurisdicional. II – 1.1. Inépcia da denúncia. A Defesa, seja na resposta à acusação, seja

nas alegações finais, sustenta que a denúncia é inepta, porque o acusado não foi

notificado/intimado regularmente, pela autoridade policial, para prestar esclarecimentos

sobre os fatos. Por isso, conclui que o indiciamento e o inquérito policial são

"manifestamente ilegais" e a denúncia (que se baseou no IPL) "inepta". Cumpre lembrar,

inicialmente, que uma das características basilares do inquérito policial é a sua

dispensabilidade. Significa dizer que, para propor a ação penal, o Ministério Público, que

é seu titular, poderá dispensar, total ou parcialmente, o inquérito policial - instaurando

ação penal independentemente da sua existência -, fundamentando a "justa causa" em

elementos informativos (ou provas) diversos daqueles amealhados pela autoridade

policial. Enfim, não há vinculatividade entre o procedimento administrativo inquisitorial

(IPL) e a ação penal subsequente. Com isso, torna-se fácil compreender que, se sequer o

inquérito policial é necessário para a promoção da denúncia, imagine a simples ausência

de interrogatório extrajudicial do indiciado. Não há que se falar, portanto, em inépcia da

denúncia, sob o argumento de que o indiciado, ora acusado, não foi devidamente

notificado/intimado, para prestar esclarecimentos na fase extrajudicial. A par disso,

verifica-se que o acusado foi regularmente citado e intimado, apresentou resposta à

acusação, foi interrogado e, ao final, também apresentou alegações finais, exercendo,

assim, todos os direitos e garantias assegurados pela Constituição Federal, sendo

respeitados, sobretudo os princípios do contraditório e da ampla defesa. À vista disso,

rejeito essa questão deduzida em preliminar. As circunstâncias ligadas ao fato de a

relação ser "técnica jurídica profissional" e às supostas mentiras apresentadas pela vítima

e pela testemunha/advogada Maria Elena serão exaustivamente analisadas adiante,

quando do exame do mérito. II – 1.2. Atipicidade penal das condutas. De acordo com a

Defesa, como o caso nasceu de uma "relação técnica jurídica profissional", não haveria

possibilidade de coexistência de infrações penais (crimes de apropriação indébita). Além

disso, atribui ao Tribunal de Ética e Disciplina da Ordem dos Advogados do Brasil

(TED/OAB) a competência exclusiva (ou, pelo menos, prioritária) para o julgamento de

uma suposta "infração ética". Essa "preliminar" também deve ser rechaçada. Isto porque,

por vezes, a mesma conduta acaba ensejando responsabilização em âmbitos diversos

(administrativo, cível, penal etc.). Trata-se da regra da independência e da autonomia

entre as instâncias, de modo que, ressalvadas algumas exceções, afigura-se plenamente

possível que o sujeito seja, por exemplo, advertido administrativamente, condenado a

reparar, na esfera cível, determinado dano material e/ou moral, e absolvido na área

criminal (ou vice-versa). Não há, em regra, vinculatividade entre as instâncias. No

presente caso, não restam dúvidas de que a conduta do acusado poderia ensejar, em

tese, processos administrativos e judiciais autônomos (como ensejou), cuja tramitação de

cada um deles ocorreria (e ocorrerá) independentemente da conclusão de qualquer outro.

Pelos mesmos motivos, também não seria necessário, em relação ao caso, suspender a

tramitação da presente ação penal enquanto se aguardaria o deslinde dos demais

processos em curso (administrativo e cível). Por isso, também rejeito essa "preliminar". II

– 1.3. 'Litispendência'. Seguindo o mesmo raciocínio exteriorizado anteriormente, a

Defesa requereu o reconhecimento de litispendência, haja vista a simultaneidade de

ações administrativa e judiciais (cível e criminal) em curso, o que caracterizaria certa

"duplicação" de ações. Dessarte, invocando as mesmas razões expostas no item anterior,

afasto essa "preliminar". II – 1.4. "Incompetência técnica material do juízo criminal". Ainda,

na mesma direção, a Defesa sustenta que este Juízo não é competente para julgar essas

"supostas infrações ético disciplinares", cabendo, apenas, à OAB NACIONAL, através de

sua Seccional/RO, receber, processar e julgar o presente caso. De fato, este juízo não

dispõe de competência para punir o acusado pela prática de "infrações disciplinares",

competência esta legalmente conferida à Ordem dos Advogados do Brasil (OAB).

Acontece que as condutas do acusado, ensejadoras dessas "supostas infrações ético

disciplinares", também violaram, ao mesmo tempo, bem jurídico tutelado pelo Direito

Penal, razão pela qual e, com base na independência das instâncias, permite-se, em

princípio, a condenação simultânea, tanto no âmbito administrativo, quanto na esfera

judicial/criminal. Nesse caso, a punição não será dentre àquelas descritas no Estatuto da

Ordem dos Advogados do Brasil (Lei n° 8.906/94), mas, sim, e mais grave, a privação da

liberdade. Portanto, rejeito essa última questão deduzida em "preliminar" e passo ao

exame do mérito. II – 2. Mérito. II – 2.1. Questões fáticas. Ultimada a instrução, restou

satisfatoriamente comprovado que o acusado/advogado apropriou-se, indevidamente, em

ocasiões distintas (29/08/2013, 10/12/2013 e 10/06/2015), das quantias de R$ 11.235,22

(1° fato), R$ 2.344,08 (2° fato) e R$ 31.520,00 (3° fato), pertencentes à vítima/cliente

Anderson Pereira dos Santos. A ocorrência das apropriações indevidas encontra-se bem

encartada aos autos, notadamente através da Ocorrência Policial, de fls. 03/05; dos

Alvarás Judiciais (n° 554/2013, 834/2013 e 372/2015), de fls. 08/10, cujas cópias

apresentam a assinatura do advogado/acusado; e da prova oral produzida. A autoria

também é inconteste, pois, apesar de alegar que não agiu com dolo, o acusado confirmou

ter se apropriado dos valores dos alvarás. O ofendido declarou que contratou o acusado

para representá-lo judicialmente na ação cível de indenização nº 1003993-

71.2012.8.22.0601 movida contra o Banco Santander e que o valor dos honorários foi

acertado em 20% (vinte por cento). Destacou também que, por diversas vezes, tentou

obter informações quanto à tramitação do referido processo, entretanto, o seu advogado,

ora acusado, apenas falava que “ele tava andando” e, posteriormente, nas últimas

conversações telefônicas, passou a dizer que “a gente tinha perdido a ação”. Acontece

que, passado certo tempo, no ano de 2016, descobriu que, na verdade, a ação havia sido

julgada procedente e o valor decorrente da indenização recebido integralmente pelo

acusado, seu advogado (v. mídia digital, de fl. 62). A testemunha Maria Elena Pereira

Malheiros confirmou os depoimentos prestados pela vítima, esclarecendo que foram três

alvarás levantados pelo acusado. Ressaltou, outrossim, que o acusado também lhe

causou prejuízo, pois, inicialmente, quando da propositura da ação indenizatória, eles

(acusado e testemunha) haviam ajustado que os honorários seriam divididos. Rememorou

que, certa vez, o acusado lhe propôs verbalmente entregar uma motocicleta para

compensar parte do prejuízo causado, comprometendo-se a pagar o restante. Arrematou

dizendo que, diante dessa conduta, perdera toda a confiança que um dia havia

depositado no acusado (v. mídia digital, de fl. 67). Somam-se a isso, as declarações

extrajudiciais (v. fl. 06) prestadas por essa testemunha/advogada (Maria Elena) que, pela

importância, passo a transcrevê-las: “a declarante esclarece que à época, no ano de

2012, pediu para POMPILIO advogar em uma causa cível em desfavor do Banco

Santander, cuja vítima é ANDERSON PEREIRA DOS SANTOS; QUE, a declarante pediu

para POMPILIO advogar considerando que POMPÍLIO é experiente na área cível, então

confiou nele e ele aceitou, sendo que ficou acertado que o valor da causa seria dividido

em partes iguais, 10% para cada um, acontece que POMPÍLIO não cumpriu com o

acordo, ou seja, se apropriou de todo o valor, inclusive do cliente ANDERSON, não

repassou para a declarante o seu valor que era devido nem tampouco de

ANDERSON, ou seja, se apropriou do valor total de R$ 45.099,30, conforme os

alvarás levantados pelo advogado POMPÍLIO, sem comunicar a declarante; QUE,

por insistência da declarante, POMPÍLIO informou que a causa havia sido perdida agora

no final de janeiro/2016; QUE, a declarante resolveu ir até o Fórum para protocolar a

causa novamente, foi então que ficou sabendo que o processo havia sido arquivado e

que tinham um levantamento de alvarás conforme já citado, daí então a declarante entrou

em contato com o advogado POMPÍLIO, momento em que este nega que tenha pegado o

referido valor e ao mesmo tempo disse para a declarante que iria receber uma herança

da mãe haja vista que esta havia falecido, e que ao receber a herança iria pagar a

declarante; QUE, o advogado POMPÍLIO, disse ainda a declarante que esteve doente e

que estava sofrendo com a morte de sua mãe, daí então, foi o último contato que a

declarante manteve com o advogado POMPÍLIO (destaquei)”. De acordo com os alvarás

judiciais, constantes às fls. 08/10, o acusado recebeu, em momentos distintos, os valores

de R$ 2.344,08 (dois mil, trezentos e quarenta e quatro reais e oito centavos), R$

11.235,22 (onze mil, duzentos e trinta e cinco reais e vinte e dois centavos) e R$

31.520,00 (trinta e um mil, quinhentos e vinte reais). Ademais, esses alvarás foram

levantados, respectivamente, nas seguintes datas: 10/12/2013 (R$ 2.344,08), 29/08/2013

(R$ 11.235,22) e 10/06/2015 (R$ 31.520,00). Interrogado, o acusado destacou que o

ofendido nunca entrou em contato com ele (acusado), confirmando, entretanto, que

levantou os valores dos aludidos alvarás. A par disso, argumentou que o último alvará, no

valor de R$ 31.520,00, refere-se as astreintes. Aduziu, enfim, que os valores apropriados

não foram repassados à vítima por dois motivos. Primeiro porque houve, no momento das

tratativas, divergência de valores quanto a divisão estabelecida entre ele e a advogada

Maria Elena (testemunha). Segundo porque o ofendido nunca lhe procurou para receber

os valores dos alvarás (v. mídia digital, de fl. 67). A versão apresentada pelo acusado,

todavia, além de estar desprovida de raciocínio lógico, não encontrou respaldo probatório.

Compete ao advogado, logo que receber alvará judicial, comunicar seu cliente,

repassado-lhe os valores devidos, independentemente de qualquer manifestação ou

procura deste. A par disso, a vítima confirmou que procurou o acusado e este lhe informou

que a ação havia sido julgada improcedente. A prova oral, mormente os relatos da vítima

e da testemunha Maria Elena, encontra-se em sintonia com a prova documental e com os

demais elementos de convicção existentes nos autos. Por isso, é de concluir-se que o

acusado, enquanto advogado do ofendido, levantou, em proveito próprio, os alvarás

judiciais nºs 554/2013 (em 29/08/2013), 834/2013 (em 10/12/2013) e 372/2015 (em

10/06/2015), apropriando-se, indevidamente, da quantia total de R$ 45.099,30 (quarenta e

cinco mil, noventa e nove reais e trinta centavos), pertencente ao seu cliente, ora vítima,

Anderson Pereira dos Santos, razão pela qual a condenação é medida que se impõe. II –

2.2. Questões jurídicas. Avaliados os fatos, verifica-se que a conduta do acusado amoldase

perfeitamente ao tipo penal previsto no artigo 168, § 1°, inciso III, do Código Penal (três

vezes), na forma dos artigos 69 e 71, também do Código Penal. Sem maiores digressões,

o acusado, em razão da sua profissão de advogado, apropriou-se, em ocasiões distintas,

da quantia de R$ 45.099,30, pertencente ao seu cliente/ofendido. Veja-se que ele só

obteve acesso aos alvarás judiciais em virtude do exercício da sua profissão de

advogado. Caso contrário, se não patrocinasse a causa da vítima, não perceberia os

valores que a ela pertenceriam. Além disso, em se tratando de uma atividade profissional

regulamentada - assim como várias outras - “o advogado obriga-se a cumprir

rigorosamente os deveres consignados no Código de Ética e Disciplina” (Lei 8.906/94, art.

33, caput). Referido Código “regula os deveres do advogado para com a comunidade, o

cliente, o outro profissional e, ainda, a publicidade, a recursa do patrocínio, o dever de

assistência jurídica, o dever geral de urbanidade e os respectivos procedimentos

disciplinares” (Lei 8.906/94, art. 33, parágrafo único). Dentre os deveres, destacam-se o

de “atuar com destemor, independência, honestidade, decoro, veracidade, lealdade,

dignidade e boa-fé” (Código de Ética e Disciplina da OAB, art. 2, parágrafo único, II). E,

precisamente, o dever de “informar o cliente, de forma clara e inequívoca, quanto a

eventuais riscos da sua pretensão, e das consequências que poderão advir da demanda”

(Código de Ética e Disciplina da OAB, art. 8º). E, por fim, estabelece o artigo 9º, do

Código de Ética e Disciplina da OAB: “A conclusão ou desistência da causa, com ou sem

a extinção do mandato, obriga o advogado à devolução de bens, valores e documentos

recebidos no exercício do mandato, e à pormenorizada prestação de contas, não

excluindo outras prestações solicitadas, pelo cliente, a qualquer momento” (o destaque é

meu). Verifica-se, outrossim, que o dolo (vontade livre e consciente) do acusado de se

apropriar, indevidamente, dos valores pertencentes à vítima/cliente, restou demonstrado

no exato instante em que ele acresceu ao seu patrimônio, tomando para si, a quantia de

R$ 45.099,30 (quarenta e cinco mil, noventa e nove reais e trinta centavos), sem sequer

comunicar e/ou prestar contas à vítima/cliente. No que diz respeito ao concurso de

crimes, nota-se que, embora sejam provenientes da mesma ação cível, os alvarás foram

percebidos em momentos distintos. O primeiro foi no dia 29/08/2013. Pouco mais de três

meses depois, em 10/12/2013, houve a segunda apropriação. E, finalmente, em meados

de junho de 2015, o terceiro e último alvará foi levantado. Veja-se, portanto, que, entre a

primeira e a segunda apropriação transcorreu lapso de aproximadamente quatro meses.

Nesse ponto, cumpre ressaltar que, o E. Superior Tribunal de Justiça vem flexibilizando o

seu entendimento no que diz respeito ao "distanciamento temporal" das condutas para a

configuração da continuidade delitiva (CP, art. 71), de modo que, em regra, o período não

poderá ser superior a 30 (trinta) dias, porém, excepcionalmente, havendo vinculatividade

entre as condutas, será permitido maior "elastério no tempo". Confira-se, a propósito, a

ementa do julgamento do Recurso Especial 1661286/RS, vazada nos seguintes termos:

“PENAL. APROPRIAÇÃO INDÉBITA. CONTINUIDADE DELITIVA. LAPSO TEMPORAL

SUPERIOR A TRINTA DIAS. EXCEPCIONALIDADE JUSTIFICADA. MANTIDA A

CONTINUIDADE DELITIVA. SÚM. 7/STJ. RECURSO NÃO CONHECIDO. 1. Embora para

reconhecimento da continuidade delitiva se exija o não distanciamento temporal das

condutas, em regra no período não superior a trinta dias, conforme precedentes da Corte,

excepcional vinculação entre as condutas permite maior elastério no tempo. 2. Tendo sido

imputada aos recorridos a apropriação de grãos que mantinham como depositários da

CONAB, conforme apurado em fiscalizações nos dias 21/11/2012 e 20/02/2013, nota-se

que a indicada apropriação de grãos deu-se por clara atividade contínua, através de

agentes que apenas foram flagrados em diferentes dias, num período de um trimestre. É

de se manter, pois, a excepcional admissão do favor da continuidade delitiva. 3. Recurso

especial não conhecido” (REsp 1661286/RS, Rel. Ministro Nefi Cordeiro, Sexta Turma,

julgado em 06/02/2018, DJe 15/02/2018). Com isso, relativamente ao 1° e 2° fatos, deve

ser reconhecida a continuidade delitiva, aplicando-se o disposto no artigo 71, do Código

Penal. Quanto ao 3° fato, por outro lado, não cabe reconhecer o crime continuado. Isto

porque já havia transcorrido lapso de quase dois anos quando o acusado voltou a se

apropriar de valores pertencentes a vítima. Além disso, esse valor apropriado (R$

31.520,00), de acordo com o próprio acusado, dizia respeito as astreintes que, embora

também pertençam ao ofendido, encontrava-se, de certa forma, desvinculado do pedido

indenizatório principal. II – 3. Conclusão. Em suma, comprovadas as condutas imputadas

na inicial, concluo que estão presentes os elementos do tipo previsto no artigo 168, § 1°,

inciso III, do Código Penal (três vezes), na forma dos artigos 69 e 71, também do Código

Penal, pelo que referidas condutas são penalmente típicas. Nenhuma excludente de

ilicitude há a militar em favor do acusado, o que tornam as suas condutas antijurídicas.

Presentes estão, também, os elementos da culpabilidade (estrito senso), a saber, a

imputabilidade, o potencial conhecimento da ilicitude e a exigibilidade de condutas

diversas, pelo que é o acusado culpável, impondo-se, via consequencial, a aplicação das

sanções correspectivas. III – D I S P O S I T I V O. Pelo expendido e considerando tudo o

que mais dos autos consta, julgo PROCEDENTE a pretensão punitiva deduzida na

denúncia e, por consequência, CONDENO Pompílio Nascimento de Mendonça,

qualificado nos autos, por infração ao artigo 168, § 1°, inciso III, do Código Penal (três

vezes), na forma dos artigos 69 e 71 (1º e 2º fatos), também do Código Penal. Passo a

dosar as penas, seguindo as diretrizes dos artigos 59 e 68, ambos do Código Penal. A

culpabilidade (lato senso), entendida, agora, como o juízo de reprovabilidade social dos

fatos e do seu autor, revela-se acentuada. O condenado é advogado militante nesta

Comarca e conhecedor da legislação, o que torna suas condutas ainda mais censuráveis.

Pompílio registra antecedente criminal negativo (v. certidões acostadas aos autos e

confirmação no SAPTJRO), posto que já fora condenado, irrecorrivelmente, pelo crime do

artigo 28, caput, da Lei 11.343/2006. Essa condenação, no entanto, proferida nos autos n°

0116477-22.2007.8.22.0601, cuja sentença transitou em julgado no dia 30/07/2009, só

será considerada, em relação ao 1º e 2º fatos, na 2ª fase de aplicação da pena, porque

caracteriza reincidência [a propósito, orienta a jurisprudência: “PENAL. AGRAVO

REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. TRÁFICO DE ENTORPECENTES.

CONDENAÇÃO ANTERIOR POR USO DE DROGAS. REINCIDÊNCIA. Revela-se

adequada a incidência da agravante da reincidência em razão de condenação anterior por

uso de droga, prevista no artigo 28 da Lei nº 11.343/2006, pois a jurisprudência deste

Tribunal Superior, acompanhando o entendimento do Col. Supremo Tribunal Federal,

entende que não houve abolitio criminis com o advento da Lei nº 11.343/2006, mas mera

"despenalização" da conduta de porte de drogas (precedentes). Agravo regimental

desprovido” (AgRg no REsp 1519540/SP, Rel. Ministro Felix Fischer, Quinta Turma,

julgado em 16/02/2016, DJe 24/02/2016)]. Relativamente ao 3° fato (praticado em

10/06/2015), em razão do transcurso de mais de 05 (cinco) anos da extinção da

punibibilidade, a condenação acima mencionada será considerada mau antecedente e

servirá para exasperação da pena-base. A par disso, o sentenciado tem outras passagens

pela Justiça Criminal, o que indicia personalidade desajustada e má conduta social. As

consequências são desfavoráveis porque os valores indevidamente apropriados não

foram restituídos, persistindo grande prejuízo de ordem material. As demais

circunstâncias integram a própria tipicidade do delito de apropriação indébita majorada.

Desta forma, ponderadas as circunstâncias judiciais, fixo as penas-bases dos crimes de

apropriação indébita descritos no 1° e no 2° fatos em 01 (um) ano e 04 (quatro) meses de

reclusão + 14 (quatorze) dias multa (para cada crime); e a pena-base do crime de

apropriação indébita descrito no 3º fato em 01 (um) ano e 06 (seis) meses de reclusão +

16 (dezesseis) dias multa. Agravo em 03 (três) meses + 03 (três) dias multa, a pena de

cada um dos crimes de apropriação indébita, descritos no 1º e 2° fatos, por causa da

reincidência. Aumento de 1/3 (um terço), a pena de cada crime, porque o condenado

recebeu os valores dos alvarás em razão da sua profissão de advogado (CP, art. 168, §

1º, III). À falta de outras circunstâncias e/ou causas de modificação, fixo a pena definitiva,

para cada um dos crimes de apropriação indébita, descritos no 1º e 2° fatos, em 02 (dois)

anos, 01 (um) mês e 10 (dez) dias de reclusão + 22,66 dias multa; e, em relação ao crime

de apropriação indébita descrito no 3º fato, em 02 (dois) anos de reclusão + 21,33 dias

multa. Considerando que os primeiros crimes de apropriação indébita (1° e 2° fatos) foram

praticados nas mesmas condições de tempo, lugar, maneira de execução etc. (enfim, com

o mesmo 'modus operandi'), além de próximos no tempo (nos meses de agosto e

dezembro de 2013), atento ao artigo 71, caput, do Código Penal, aplico tão somente a

pena de um desses crimes, aumentada de 1/6 (um sexto), totalizando parcialmente a

sanção em 02 (dois) anos, 05 (cinco) meses e 16 (dezesseis) dias de reclusão + 26,43

dias multa. Esclareço que para exasperação de 1/6 (um sexto), levei em consideração o

número de crimes concorrentes (dois). Na forma do artigo 69, caput, do Código Penal,

somo as penas - resultado da continuidade delitiva (1° fato e 2° fato) + 3° fato - totalizando

definitivamente a sanção em 04 (quatro) anos, 05 (cinco) meses e 16 (dezesseis) dias

de reclusão + 48 (quarenta e oito) dias multa, pena esta que entendo necessária e

suficiente para prevenção e reprovação dos crimes cometidos. Atendendo ao disposto no

artigo 387, inciso IV, do Código de Processo Penal, estabeleço como valor mínimo para

reparação do dano material causado pelas infrações, considerando os prejuízos

experimentados pelo ofendido, a importância de R$ 45.099,30 (quarenta e cinco mil,

noventa e nove reais e trinta centavos). Atento a condição econômica do sentenciado

(declarou renda mensal de R$ 5.000,00), fixo o valor do dia multa em 1/5 (um quinto) do

valor do salário mínimo vigente ao tempo dos fatos, valor este que deverá ser atualizado,

quando da execução, pelos índices de correção monetária. O regime inicial para o

cumprimento da pena privativa de liberdade será o fechado (CP, art. 33 § 2º ‘a’ c/c § 3º),

porque o sentenciado é reincidente em crime doloso e existem circunstâncias judiciais

desfavoráveis. Deixo de substituir a privação da liberdade, por penas restritivas de

direitos, porque o condenado não preenche os requisitos legais (CP, art. 44, I, II e III), ou

seja, porque a pena total imposta é superior a 04 (quatro) anos, o sentenciado é

reincidente em crime doloso e existem circunstâncias judiciais desfavoráveis. Pelos

mesmos motivos não pode ser concedida a suspensão condicional da pena, ex vi do

artigo 77, do Código Penal. Faculto ao condenado o apelo em liberdade porque nesta

condição vem sendo processado e não verifico o surgimento de algum fundamento para a

decretação da prisão preventiva. Após o trânsito em julgado o nome do réu deverá ser

lançado no rol dos culpados e expedida a documentação necessária, para fins de

execução. Custas pelo condenado. Os valores da pena de multa e das custas judiciais

deverão ser recolhido no prazo de 10 (dez) dias, sob pena de inscrição em dívida ativa,

nos termos do artigo 51, do Código Penal. Publique-se. Registre-se. Intimem-se.

Comunique-se (INI/DF, II/RO, OAB/RO, TRE/RO etc.). Decorrido o prazo para eventual

recurso e cumpridos os comandos desta sentença, os presentes autos poderão ser

arquivados". Nada mais.

Juiz - Edvino Preczevski

Direito ao esquecimento

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