A criação de uma comissão composta por representantes de todos os órgãos (municipais, estaduais, federais, dos consórcios e dos atingidos por conta do complexo de energia) para, dentro do prazo de dez dias, elaborar e efetivar pontos de reparação de danos e indenizações a Rondônia e sua população. Foi o que ficou definido na longa audiência pública, que durou 6h30 na Assembleia Legislativa, na quarta-feira (24), e debateu sobre o impacto ambiental causado pelas obras das usinas hidrelétricas de Santo Antônio e Jirau e suas compensações sociais, empreendimentos que estão sendo construídos no rio Madeira, em Porto Velho, capital do Estado.
Proposta pelo presidente do Poder Legislativo, deputado Hermínio Coelho (PSD), a audiência permitiu a participação de todos os interessados com direito a voz. “É a melhor maneira de se chegar ao bom entendimento. Afinal de contas, a população e o Estado, principalmente Porto Velho, está sofrendo as consequências dessas obras que vão gerar energia para todo País. O posicionamento do poder público, dos órgãos fiscalizadores e da população é muito importante para se resolver as pequenas e grandes questões, refletidas pelos impactos das duas grandes usinas. O certo é que Rondônia não pode servir apenas de barriga de aluguel para os dois empreendimentos. Não podemos pensar pequeno. Essas usinas deveriam e devem ser usadas como barganha para que possamos resolver situações que estão impedindo o crescimento do Estado como um todo. A transposição de servidores para o quadro da União, o pagamento da dívida do Beron, as questões de segurança pública, saúde, educação e transporte poderiam ter sido inseridas como condições para a liberação das licenças para a construção das duas usinas. Lamentavelmente, isso não aconteceu e, agora, estamos aqui, mais uma vez, em busca de solução para a degradação do meio ambiente e da problemática social”, posicionou-se o dirigente maior da Assembleia Legislativa.
Assentados do Joana D’Arc
Diante de pessoas que exigiam providências para resolver o isolamento dos moradores que estão sendo atingidos diretamente pelos danos causados pelas usinas de Santo Antônio e Jirau, o deputado Hermínio Coelho pediu aos representantes do consórcio de Santo Antônio solução rápida para os assentados do Joana D’Arc 1, 2 e 3. “Esse povo quer apenas o que é de direito. Enquanto não se apresenta o pedido completo sobre as compensações e indenizações, peço que se arrume as estradas que dão acesso a essas localidades, assim como a da Vila Nova de Teotônio. A recolocação desses agricultores em terra fértil é mas do que necessário. Esse impasse precisa acabar o mais rápido possível”, conclamou o presidente da Assembleia Legislativa ao tempo em que anunciou que já solicitou a assessoria jurídica do Legislativo e, também, fará consulta ao Judiciário no sentido de encontrar amparo legal para embargar as obras das duas usinas que estão sendo construídas no rio Madeira. “Só dessa forma vamos poder resolver tudo que está pendente e os danos que estão sendo causados a Rondônia e a sua população”, asseverou.
Representantes dos Consórcios
Os representantes dos Consórcios de Santo Antônio e Jirau, que mais ouviram dos que falaram, colocaram-se à disposição para resolver as questões dentro da melhor maneira. O diretor técnico da Santo Antônio Energia, Antônio de Pádua, disse que Santo Antônio está cumprindo seu papel. Vai ficar 35 anos em Rondônia, conforme previsão da concessão. “Em momento algum vamos substituir as obrigações da administração pública. Não podemos fazer isso. Estamos sempre dispostos a conversar”, destacou.
Já o consultor da Energia Sustentável do Brasil, Édio da Luz, falou como será gerada a energia pela usina de Jirau. Informou que, quando do funcionamento pleno da usina, serão repassados cerca de R$ 90 milhões por ano para o Estado e município de Porto Velho (50% para cada). Pediu para a comunidade fiscalizar e controlar a aplicação dos recursos. Disse que a Energia Sustentável vai ficar 35 anos em Rondônia e que não vai alterar a cota do projeto em Jirau. Citou o trabalho realizado no combate a malária em Porto Velho. Colocou-se à disposição para participar de comissão que se formar para discutir as questões relativas a usina de Jirau, observando que “uma obra dessa envergadura traz consigo coisas boas e ruins”.
A secretária de Estado do Meio Ambiente, Nancy Rodrigues da Silva, elogiou as representatividades das comunidades atingidas pelas obras das usinas de Santo Antônio e Jirau. Foi taxativa que houve violação dos direitos das comunidades atingidas e que esteve, acompanhada de técnicos da Sedam, na Comunidade de São Sebastião e constatou o encharcamento da terra e o desbarrancamento do rio Madeira com erosão. Informou que há relatório da Sedam que comprova tudo que o foi dito, através de constatação dos técnicos. “O governador determinou à Sedam que fizesse o dimensionamento que está afetando as comunidades para dar encaminhamento e tomar posição como governo do Estado”, assegurou ao sugerir a criação de um grupo técnico (comissão mista) com a presença das empresas e das comunidades para resolver os conflitos. “Quem tem competência para licenciar e embargar as obras é o Ibama, pois a obra é do Governo Federal. Nós, da Sedam, só fazemos as constatações e encaminhamos para os órgãos competentes para as medidas cabíveis”, completou.
Ao assegurar que “o que se recebeu até agora foi muito mal aplicado”, o conselheiro substituto Francisco Júnior Ferreira da Silva disse que o Tribunal de Contas do Estado vem atuando ao lado do Ministério Público de Contas e do Ministério Público do Estado juntos as empresas que estão construindo as usinas de Santo Antônio e Jirau. Falou sobre os EIA Rima e no plano básico ambiental. Comentou sobra a licença prévia e as compensações ambientais e sociais. Enfatizou que havia previsão para a construção de um hospital em Porto Velho, mas o poder público decidiu usar o dinheiro em novos apartamentos nos hospitais já existentes. De forma direta, culpou o Governo pela falta de planejamento e não hesitou em afirmar que “houve falhas na escolha do que foi feito, pois o poder público apontava e o empreender fazia”.
Francisco Júnior argumentou que tem saída para se aproveitar melhor os recursos que estão a ser repassados, pois o cálculo da população atraída, já que veio mais gente do que estava previsto, precisa ser considerado. Segundo o conselheiro substituto, o erro dos dois empreendimentos foi não chamar os órgãos de controle MP e TC para o debater as obras, já que quem definiu tudo foi o Governo e a Prefeitura. Defendeu a negociação e deixou claro que os órgãos públicos precisam estar envolvidos nas questões.
O promotor de justiça Aluíldo Leite garantiu que o Ministério Público é legítimo defensor da sociedade e lamentou a ausência de representantes do Ibama, órgão licenciador e fiscalizador ambiental das obras. Ele citou algumas ações na Justiça, que contestam os estudos ambientais e também a elevação da cota do reservatório da usina de Santo Antônio. Sobre a questão dos moradores do assentamento Joana D’arc, o promotor Aluíldo informou que um agravo da tutela de urgência vai ser julgado no próximo dia 30. “Para garantir um dos direitos fundamentais do cidadão, que é o direito à moradia, hoje impossibilitada em razão das condições”, relatou. Aluíldo garantiu que o Ministério Público não abre mão das ações impetradas de reparação de danos e que vai continuar na defesa da população e do Estado de Rondônia.
O vereador Jair Montes (PTC), presidente da CPI das Compensações na Câmara de Porto Velho, disse que “dois grandes empreendimentos, tão importantes para o país, não podem tratar cidadãos brasileiros com desprezo. Mas, não podemos deixar de registrar que as autoridades locais são responsáveis por essa situação. Não posso deixar de criticar a inércia da bancada federal”. Segundo ele, Porto Velho e Rondônia são tratados pelos consórcios, como “barrigas de aluguel”. “Hoje, vivemos apenas sob o desmando e o caos e se tiver que fechar as usinas, vamos fazer isso para que elas nos respeitem”, completou.
O coronel da reserva, José Pimentel, coordenador municipal da Defesa Civil, declarou que “decretamos estado de emergência no distrito de Calama, em razão do desbarrancamento do rio Madeira. Houve ainda interdições na Comunidade São Sebastião, dos Mirantes e a desocupação de famílias de alguns bairros. Após essas medidas, foram feitos estudos de batimetria no rio e estamos avaliando esses resultados”.
O vereador Dindin (PSL) acusou o consórcio de Jirau de “dar calote” na população do distrito de União Bandeirante, ao dizer que fizeram uma unidade de atendimento à malária. “A obra não foi concluída, mas o consórcio faz propaganda dizendo que entregou”.
O chefe da Casa Civil do Governo de Rondônia, Marco Antônio de Faria, parabenizou o promotor Aluído Leite e a promotora Daniela pelo ajuizamento da Ação Civil Pública que tenta indenizar e recolocar os moradores do Assentamento Joana D’Arc em local apropriado. Salientou que o governo fará o que puder para ajudar os assentados e disse que às portas estão sempre abertas aos assentados. Sugeriu uma mesa de negociação para discutir a questão de todos os problemas causados pelas obras das usinas de Santo Antônio e Jirau e disse que não vai admitir que o governo seja criticado por ações que não lhes dizem respeito e que, também, não concorda com críticas generalizadas. Garantiu que tem amizade com todos os 24 deputados e sugeriu para que a Assembleia embargue as obras ou faça lei para embargá-las e que qualquer sugestão será acatada pelo governo.
O Prefeito de Guajará-Mirim, Dulcio da Silva, elogiou a iniciativa do deputado Hermínio Coelho pela realização da audiência pública. Foi taxativo que as obras estão sendo concluídas e os problemas ficando em Rondônia. “As queixas estão aí para todos tomarem conhecimento. Tem que haver parceria para o bom entendimento”, ressaltou ao solicitar compensação para revitalização da Estrada de Ferro de Guajará até Nova Murtinho, bem como pediu a construção de dois barcos saúde para atender as comunidades ribeirinhas. Disse estar aberto à discussão com as empresas de Jirau e, também, de Santo Antônio.
Os deputados Maurão de Carvalho (PP) e Adelino Follador (DEM) sugeriram a criação da comissão envolvendo todos os órgãos envolvido e representantes do Joana D’Arc e demais atingidos. No entendimento dos parlamentares, os consórcios vão entender e acabar com o impasse. Os deputados Ribamar Araújo (PT) e Zequinha Araújo (PMDB) também acompanharam o tempo todo o desenrolar da audiência pública e defenderam o diálogo para se chegar ao bom termo o impasse entre os consórcios e os atingidos pelas obras das usinas de Santo Antônio e Jirau.
Ao encerrar a audiência pública, o presidente Hermínio Coelho disse que quem tem que resolver tudo são os políticos e a administração pública. “Deixar tudo por conta do Ibama é querer ser enganado. Tudo que o Governo Federal fez até agora foi premeditado, não planejado. Temos que realizar a política republicana. Temos que ser práticos. A questão dos assentados de Joana D’Arc tem que ser resolvida imediatamente. O problema é para ontem”, completou.