Quem matou Isabela? Se depender da mídia brasileira, em especial a televisiva, os assassinos são o pai e a madrasta da menina paulista e rica. Desde o anúncio da morte da criança, a imprensa se colocou a favor do espetáculo macabro que consiste em explorar uma tragédia até a última gota em busca da audiência de um público sedento de más notícias.
Não questiono a necessidade de divulgação de fatos como este, mas para tudo existe um limite da decência e, principalmente para a imprensa, deve haver ética e imparcialidade.
Ao deixarmos para a justiça a condenação ou absolvição do casal estamos apenas cumprindo nosso papel de informar sem buscar influenciar a opinião pública.
A questão central é a forma violenta e catastrófica com que a mídia tem tratado este caso, que é apenas mais um neste país de tragédias. Não quero aqui negar a brutalidade da morte da menina Isabela, mas sim o sentido de espetáculo que se tornou o fato.
Existe imparcialidade da imprensa neste caso? Claro que não. E não falo isso em termos de ética jornalística apenas, lembro que a parcialidade surge desde a escolha do que deve ou não ser notícia explorada por quase um mês. Será que uma menina negra e pobre, morte após ser estuprada e esganada em uma favela teria tanta repercussão na mídia televisiva? Mais uma vez a resposta é não. A beleza estética da menina rica foi fundamental para que a televisão brasileira adotasse este caso como ponto principal de praticamente todos os noticiários e até programas de entretenimento.
Não é possível que os jornais, revistas, televisões e rádios se pautem em apenas um caso para sustentar a audiência. Este caso em nada contribui para o desenvolvimento da população, não colabora com a economia brasileira, não oferece informações educativas, sociais ou jurídicas que possam ajudar as pessoas na conquista de interesses próprios ou coletivos.
Isto nada mais é que a exploração revoltante de uma tragédia familiar para manter a alienação da sociedade brasileira, através de dados insignificantes. Mas, o público que se mantém na frente da tv, ou até mesmo corre para os portões das casas dos acusados, é o mesmo que se comove com as dezenas de mortes por dengue no Rio de Janeiro, enquanto o povo daqui morre sem atendimento médico adequado ou sofre com a malária. É o mesmo que chora com os dramas de participantes do BBB e que ao mesmo tempo não dá a mínima importância para milhares de pessoas desabrigadas pelas enchentes no Nordeste ou a ameaça de morte de religiosos no coração da Amazônia.
Esta parcialidade em busca de uma audiência motivada pela alienação da sociedade que não se preocupa com a falta de esgoto, de água tratada, desvio de verbas públicas e muitas outras tragédias urbanas, só traz prejuízos para um público que deveria cobrar também da imprensa o desempenho de seu papel social que é contribuir para o desenvolvimento da comunidade.
Buscar o culpado pela morte da menina Isabela é apenas um passatempo para quem não se incomoda com a educação dos próprios filhos ou não dá importância para a evolução do ser humano. Será que descobrir quem matou a criança vai mudar minha vida? Claro que não. Mas, saber de que forma o Poder Público vai gastar este ou aquele recurso vai sim interferir na minha vida.
Não existe imparcialidade no caso, pois para o grande público o casal já foi condenado, mesmo antes do julgamento. Acreditar que a mídia apenas apresenta o que o povo espera ver, é uma teoria antiga e que não se sustenta mais. A sociedade quer ser bem informada e não apenas influenciada por matérias inúteis e sem respeito pelos direitos individuais.