* Vendedor, ex-bancário, desempregado nos últimos dias, soube que Jarbas faleceu aos 55 anos, vítima de câncer. Um cidadão anônimo para a sociedade rondoniense. E para os jornalistas, seus futuros colegas se o destino lhe proporcionasse mais uns três anos.
* Jarbas era um dos estudantes beneficiados pelo projeto Prouni, que entrou em cena no ano de 2005, durante o governo Luís Inácio Lula da Silva.
* Como boa parte dos brasileiros, trabalhou muito e não teve tempo de estudar. Pouco depois dos cinqüenta anos resolveu fazer um curso supletivo e ao final do mesmo prestou o exame nacional do ensino médio, conhecido como Enem. Isso lhe possibilitou acesso ao curso de Jornalismo da Faro, uma das instituições em que leciono.
* Jarbas era o veterano da turma. Sentia algumas dificuldades no aprendizado; por conta de uma vista afetada pelo tempo, utilizava lentes fortes, sendo obrigado a sentar na primeira fila, buscando através da informação oral uma absorção maior dos conhecimentos fornecidos por professores e colegas.
* Confesso que não sei a origem da doença, mas o acadêmico Jarbas fumava muito, umas duas ou três carteiras de cigarro e gostava de conhaque. Gente boa, diversas vezes comentou sua dificuldade em se adaptar à sala de aula no meio de garotos de uma geração bem diferente. Achava estranho ver colegas conversarem em sala de aula quando a vida lhe ofereceu uma chance depois de meio século. Numa de nossas conversas disse que no dia em que os agentes da educação lhe enviaram a carta comunicando sua nota e aprovação para a bolsa do curso de Comunicação Social estava sozinho e chorou muito, pois não tinha mais esperança de entrar numa faculdade.
* A vida é cheia de surpresas. Grande, falante, questionador, entrou num mundo diferente, onde as idéias clássicas são lançadas em volume avassalador. Sua vivência ajudava a contornar as dificuldades. Era um aluno aplicado, tinha iniciativa.
* Foi de uma geração vitimada pela propaganda enganosa que oferecia o cigarro como sinônimo de virilidade. O câncer atingiu pulmão e rins. Durante anos os governos ficaram omissos diante do poder das empresas que produzem cigarros e permitiu propagandas belíssimas. Talvez as mais bonitas concebidas durante certo período, associando aventura, mulheres, sucesso profissional. Que pena que isso tenha sido permitido durante tanto tempo.
* Foi muito bom conviver durante um ano com Jarbas Vieira. Nossa última conversa foi em julho de 2006. Acreditava ainda que depois dos tratamentos de quimioterapia e radioterapia poderia voltar ao convívio acadêmico. Temia perder a bolsa de estudos. Era uma de suas sustentações morais para lutar contra a doença.
* O destino decidiu diferente. Dia 24 de outubro perdemos um futuro jornalista e ganhamos um referencial de luta. Valeu Jarbas. Sua presença serviu de estímulo para quem tem esperanças. Um grande abraço.
*Hamilton Lima é professor universitário.