Sulfatos, nitratos, amônia, cloreto de sódio, fuligem e monóxido de carbono misturam-se numa suspensão de partículas que vão se depositar nos pulmões das pessoas.
Foto: Divulgação
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O desavisado que desembarcar na Amazônia sonhando com a paisagem exuberante da floresta tropical, vai ficar chocado com a cena de realidade distópica forjada pelo verão amazônico. Neste ano as queimadas de agosto estão como no pico da seca, que só ocorre em outubro. Sem chuvas e com temperaturas muito altas, a floresta perde umidade e os focos de incêndio se multiplicam sem controle.
A fumaça sobe e parece aplicar nos céus um desses filtro de fotografia para deixar o céu cinza e o sol alaranjado. Sulfatos, nitratos, amônia, cloreto de sódio, fuligem e monóxido de carbono misturam-se numa suspensão de partículas que vão se depositar nos pulmões das pessoas. Além de florestas, queimadas devastam a saúde das pessoas que vivem na Amazônia.
Você que está no Sudeste e além, talvez se ache protegido pela distância. Mas não está. Para não repetir que as queimadas na Amazônia alteram o regime de chuvas em todo o Brasil, lembro o estranho fenômeno na cidade de São Paulo, em 19 de agosto de 2019. No meio da tarde, o dia virou noite. Sem tempestade nem garoa, a causa da escuridão que assustou os paulistanos foi a mesma que, afirma a MetSul, agora compromete a qualidade do ar que se respira em Porto Alegre: "a fumaça que se origina na região amazônica, no Pantanal e na Bolívia".
Você, empresário de outras regiões do Brasil, imagina o alto custo do fogo para quem empreende na Amazônia. Mas lamento informar que você também é sócio do prejuízo das queimadas. Elas carimbam a marca Brasil e desvalorizam os produtos brasileiros no mercado global. Aqui não cabe fazer esse debate, até porque todos concordamos que quanto mais alta a pegada de carbono de um insumo ou produto, menor a competitividade e maior a dificuldade de acessar os melhores mercados, cada vez mais cercados por barreiras como o Carbon Border Adjustment Mechanism (CBAM), criado pela União Europeia para quantificar e taxar as emissões de produtos importados. Como qualquer empresa, o país que não busca práticas mais sustentáveis compromete sua própria sustentabilidade.
O céu esfumaçado da Amazônia sugere que estamos queimando dinheiro. E, na verdade, estamos. A McKinsey projeta que em 2030 o mercado de carbono atinja incríveis US$ 50 bilhões. Enquanto isso, o Brasil segue sem regulamentar o mercado de carbono e queimando florestas com alto potencial de estoque de carbono e também de captura, quando manejadas.
Países ricos precisam compensar emissões da indústria, da geração de energia, dos transportes. Já as emissões no Brasil vêm da agressão aos biomas, mais de 75% delas das queimadas na Amazônia. E não temos nem pacto, nem foco para combater às queimadas. Isso tornaria possível cumprir nossas metas de redução de emissões, estruturar uma economia sustentável na região Norte, diminuir desigualdades, melhorar a qualidade de vida na Amazônia. Mas o fato é que depois da diminuição registrada em 2023, as queimadas voltaram a crescer fortemente neste ano eleitoral de 2024. Isso pega mal para o país que vai sediar a COP 30 na Amazônia.
Em Porto Velho, onde escrevo este artigo, a qualidade do ar é considerada perigosa para a vida humana. Essa insalubridade se espalha pelas florestas mais além e mais profundas. Nem indígenas, nem ribeirinhos escapam dela. Recebo notícia que a atmosfera é a mesma em Cruzeiro do Sul, cidade do Acre localizada no ponto mais ocidental da Amazônia brasileira.
Se nada disso lhe incomoda, perdão, mas é bom pensar no assunto. Ou melhor, é bom fazer algo, tomar posição, colaborar de alguma forma com o combate às queimadas na Amazônia, pois mesmo que você não sinta o quanto elas ardem, sua saúde e seus negócios também estão queimando no fogo na floresta.
* Marcelo Thomé é presidente da FIERO, vice-presidente da CNI e presidente do Instituto Amazônia +21.
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